quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Traços


* Por Núbia Araujo  Nonato do Amaral


Dormi pensando no meu pai, acordei cedo e ele comigo. Sentei buscando nas lembranças algo mais pueril, mais ingênuo, mais criança.

Lembrei-me que nos juntávamos pra desenhar. Ele sempre repetia o mesmo traço, nunca se atrevia mais e nos acostumamos.

Nos habituamos a um pai seco, rude, sem muito esboço. Um pai nem sempre tão presente, nem sempre sorridente. Nos acostumamos com o pai trovão que rugia alto à mesa.

Conforme fui crescendo o rugido do velho leão foi se perdendo e só me dei conta disso quando comecei a enxergá-lo como pai. Um pai forjado talvez às pressas, na dificuldade de criar cinco meninas. Meu Deus! Cinco meninas...

Busco naquilo que me é possível desenterrar o amor que eu não entendia, busco perdoar na menina imagens que eu não percebia, busco no velho leão que agora dorme o afago que eu não reconhecia. Tomara pai, que um dia você nos entenda e que nos traços possamos resgatar mais do que rabiscos.

 * Poetisa, contista, cronista e colunista do Literário


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