Guerra e paz
* Por
Clóvis Campêlo
Sou de paz em tempos
de guerra e de guerra em tempos de paz. Evoluções me interessam. Mentiras
sinceras, não. Talvez isso faça com que me sinta vivo no mar de insensatez que
é a vida moderna.
Sempre que vejo
imagens antigas do passado, fico pensando como a vida parecia ser mais fácil
antigamente. Talvez esteja ficando velho demais para acompanhar a rapidez das
mudanças atuais. Nem mesmo consigo entender o que fala meu neto mais velho,
Pedro, quando se refere aos seus jogos e personagens virtuais. Percebo que hoje
a maior parte das minhas referências estão no passado. Quando muito, consigo
manejar o computador e escrever minhas mal traçadas linhas. Já me contento com
isso.
Confesso que sempre
almejei um mundo melhor, com mais justiça social e melhor distribuição de
renda. Para mim, seria apenas uma questão de tempo para que isso acontecesse.
Imaginava que um dia as pessoas perceberiam o equívoco dos seus credos e
optariam por um mundo mais equânime.
Nos tempos do Jubrapi,
no Pina, nos seminários promovidos pelos padres oblatos, o sociólogo Carlos
Rocha afirmava que o socialismo seria uma consequência natural do capitalismo.
Era esperar para ver. No mundo justo de Deus não deveria haver espaço para a
fome, a exploração do homem pelo próprio homem, a injustiça. Eu tinha a
impressão, naquela época, de que o próprio Deus estava empenhado no
restabelecimento desse equilíbrio. Afinal, éramos todos irmãos (ou deveríamos
sê-los). A divisão geopolítica do mundo sempre me pareceu um equívoco a ser
remediado. Era só escolher o caminho e segui-lo. Haveria uma força tamanha a
proteger os homens de boa vontade que se empenhassem nisso. Eu, na ingenuidade
da minha adolescência, acreditava piamente nisso. Na maior parte da minha vida,
direcionei os meus esforços e esperanças nesse sentido. Não me arrependo, mas
poderia ter sido um pouco menos crédulo, mais pragmático e ter percebido que a
vida, no futuro, especialmente a minha, quando as forças vitais começassem a
fraquejar, necessitaria de uma melhor estrutura para se apoiar e sobreviver.
Hoje, percebo
estarrecido que antigos amigos que dividiam conosco essas esperanças e crenças,
mudaram de atitude e, não sei se por benefícios pessoais ou por degeneração de
caráter, defendem ideias e políticas deletérias e facciosas. Como, para mim,
toda relação humana deve se basear em fatos concretos comuns, não vejo como
manter esses relacionamentos apenas baseado em pontos comuns do passado ou em
considerações mortas e insustentáveis. Não consigo achar que a verdade possa
ter dois lados. E dentro da visão maniqueísta de que quem não está comigo está
contra mim, passo a vê-los, no mínimo, como antagonistas.
Se a minha pretensão
ainda é encaminhar o mundo para o lado da justiça e da irmandade (mesmo que
isso possa parecer cada vez mais impossível) não tenho como conviver ou perder
tempo com equívocos e maus discernimentos.
Penso que hoje vivemos
a educação para o egoísmo e a individualidade. Vivemos a bestialização das
pessoas e a insensibilidade diante dos problemas do mundo e do outro. Deixar-se
envolver e levar por isso, para mim, significa desistir de toda uma vida de lutas
e de atitudes em busca do bem comum.
Recife, outubro 2016
* Poeta, jornalista e radialista.
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