Pétreos e pútridos
* Por
Urda Alice Klueger
Escrevo a 03.05.2016 –
16 dias se passaram desde aquela horrorosa noite, mil vezes pior do que aquele
7 x 1 de final da Copa, quando perdemos para a Alemanha – quando a grande
maioria dos nossos deputados mostrou sua verdadeira cara, e faltam uns poucos dias
para que também os senadores votem, e sequer suporto olhar para suas caras
pétreas e pútridas, outra grande maioria vendida para o poder do grande
capitalismo internacional. Votarão a favor do golpe, claro. Toda a encenação
que se faz no senado, de acusação e defesa, não passa de uma comédia nojenta –
cada senador já decidiu, desde o começo, como vai votar, e prevejo a mesma
baixaria que rolou quando dos deputados, e eles estão lá, com suas caras
pétreas e pútridas, inatingíveis por qualquer argumento, pensando antes de tudo
no que suas atitudes trarão para os seus bolsos – porque haverá lucros, é
claro, e não sei todos os caminhos que o capital usa para comprar consciências,
mas posso imaginar: uma nova maravilhosa amante, uma conta num paraíso fiscal,
sei lá o que mais. Penso que se Jesus Cristo em pessoa descesse de repente lá
dentro do senado não conseguiria alterar a ganância com que os pútridos
senadores alimentam sua ganância – com as raras exceções, as de sempre, é
claro.
Pensei em tantas
coisas para escrever, nestes dias todos, mas a cada vez que abro a Internet lá
está um texto de análise nacional ou internacional, ou textos didáticos
tentando melhorar a opinião de alguém, dizendo exatamente o que eu gostaria de
dizer, e sei que a força da mídia golpista e a violência do capital já formaram
as opiniões, que estão pétreas, e nem o melhor analista e nem o melhor pedagogo
consegue diminuir essa distância que está acontecendo, que separa o Brasil em
dois e cria inimizades e ódios, e então penso: o que resta para eu escrever?
Há uma coisa que não
vi ninguém escrever, ainda, e que é dura mas que me parece muito real: os
pútridos parlamentares que estão praticando o golpe representam exatamente a
nossa sociedade. Olho no meu entorno e vejo amigos, parentes, vizinhos a
dar-lhes razão, a querer o golpe, a querer a divisão do país, a insuflar ódio,
a sonhar com um neoliberalismo que nem compreendem o que é, a dizerem tal sorte
de besteiras que não dá nem para argumentar e nem discutir, tão pétreos, ocos e
bobos que não se pode imaginar quanto, e se posso desculpar um jovem que não
viveu os tempos em que se tinha 84% de inflação ao mês ou a um semianalfabeto
que me para para conversar e me diz da sua revolta porque a Globo está vendida
para a Dilma (Oh! Céus, como argumentar qualquer coisa com alguém assim?), não
posso desculpar aos que tiveram a oportunidade da escola e do ensino, já
viveram o neoliberalismo no país e não conseguiram aprender nada e ainda ajudam
a insuflar o ódio que pode, talvez, nos levar a uma guerra civil, em pouco
tempo.
Então olho para aquele
congresso pútrido, com as suas opiniões pétreas, e vejo como ele representa um
povo com muita, muita ignorância, despolitizado, avesso a aprender, batendo no
peito com orgulho para dizer grandes heresias políticas, e então penso no que
será deste país que como que se vai afundando num lodaçal de ignorância, e de
como a ignorância pode ser tão facilmente manejada pela imprensa golpista e
pelo grande capital internacional.
A diferença entre o
povo e o congresso é que, se um é ignorante por falta de oportunidade ou por
burrice mesmo, no congresso não há ignorância – há lá um mercado, um grande
mercado de comprar consciências e de fazer o povo de bobo, e são muito poucos
os que lá estão que pensam realmente nas gentes do país e não no seu próprio
bolso. Daí que não dá para perdoar um congresso assim. Pútrido, nojentamente
pútrido.
Blumenau, 03 de maio
de 2016.
* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e
doutoranda em Geografia pela UFPR, autora de vinte e quatro livros (o 24º
lançado em 5 de maio de 2016), entre os quais os romances “Verde Vale” (dez
edições) e “No tempo das tangerinas” (12 edições).
Hoje já é o dia seguinte. Perdemos de 55 a 22. Amanhã é sexta-feira treze.
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