sábado, 19 de setembro de 2009


Poetas da moda

Prezado e assíduo leitor, boa tarde. Você já notou como em cada época há um poeta que fica na moda? A imprensa fala dele, os namorados valem-se dos seus versos para expressarem amor, nos círculos estudantis mais intelectualizados seus poemas são recitados a todo o momento e vai por aí afora. Parece que cada geração elege os seus.
O chato é que, passado certo tempo, eles vão sendo esquecidos aos poucos e, quando se percebe, ninguém mais fala deles. O ideal é que nunca os apreciadores de poesia os esquecessem. Que seus versos fossem imortalizados e estivessem sempre na mente e nos corações de todos. Afinal, a vida, sem poesia, torna-se de uma chatice atroz.
Ao longo da minha vida, já vi muitos poetas entrarem e saírem de moda. Essa é a vantagem de se viver muitos anos, sem perder, jamais, o interesse pelas artes e coisas do espírito. Já vi Castro Alves, Olavo Bilac, João Cruz e Sousa, Mário de Andrade, Oswald, Guilherme de Almeida, Paulo Bonfim, Cecília Meirelles, Augusto Frederico Schmidt, Manuel Bandeira, Vinícius de Moraes, Carlos Drummond de Andrade, Paulo Setúbal, Mário Quintana, J. G. de Araújo Jorge e tantos outros serem recitados com naturalidade por adolescentes, recém entrados na adolescência.
Muitos, vira e mexe, retornam à moda. Outros tantos, jamais voltam a ser lembrados. Quem perde mais com esse esquecimento, evidentemente, é quem os esquece ou, pior, que sequer toma conhecimento de quem foram e do que escreveram.
Os casos dos que nunca saem de evidência são muito comuns (felizmente). Nem é preciso citar, pois todos os amantes de poesia têm seus nomes (e seus poemas) na ponta da língua: Bandeira, Drummond, Vinícius, Quintana, Cecília...
Aprendi muito com esses poetas. Fiz muito sucesso com as meninas (quando adolescente, claro), recitando seus versos. Conheço décor pelo menos uma centena de poesias desses meus ídolos de sempre. Não raro, quando estressado e quero desabafar, saio pela casa declamando (para desespero e constrangimento da mulher e dos filhos), versos como:

“Eu, filho do carbono e amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco
Este ambiente causa-me repugnância
E sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa à boca de um cardíaco.

Já o verme, este operário das ruínas
Que o sangue podre das carnificinas
Come e à vida em geral declara guerra

Anda a espreitar meus olhos para roê-los
E há de deixar-me apenas os cabelos
Na frialdade inorgânica da terra”.

Sabem quem é o autor deste soneto? É Augusto dos Anjos, médico que foi, também, professor de Português no prestigioso Colégio Dom Pedro II, do Rio de Janeiro. Foi um dos poetas da moda nos chamados “Anos Dourados”, de meados dos anos 50 a meados dos anos 60 do século XX. Seus poemas eram recitados a todo o momento e a preferência recaía nos mais trágicos, tétricos e pessimistas.
Ganhei muito cartaz com as meninas recitando seus versos, com pose de rebelde, por causa dos cabelos compridos (que na época eram o máximo de transgressão que um jovem poderia cometer) e conquistei, rapidinho, fama de poeta, embora meus poemas de então fossem pífios e quadrados. Creio que cada um de vocês, queridos leitores, teve (e espero que ainda tenha) o seu poeta da moda. Que bom seria se eles nunca fossem esquecidos, geração após geração! Mas...

Boa leitura

O Editor.

Um comentário:

  1. Estudei no Pedro II e fui colega de turma de um sobrinho-bisneto do grande Augusto dos Anjos, o Marquinhos. Ele me revelou sua ascendência, não acreditei e, para me provar, o doido apareceu no colégio com város manuscritos do celebérrimo poeta! Tomei tal susto que nem quis tocar naquele tesouro, chamei a professora de Literatura que chamou a família e, acredito, os tais papéis devem estar, hoje, na Biblioteca Nacional. Assim espero.

    ResponderExcluir