Para além das fachadas de Laguna
* Por
Viegas Fernandes da Costa
Laguna é uma cidade
fascinante. Fronteira sul do primeiro século da ocupação portuguesa na América,
terceira cidade fundada em Santa Catarina, capital da inusitada República
Juliana e palco do encontro de Garibaldi e Anita. É em Laguna que encontramos
os botos que pescam junto com os homens, a curiosíssima Pedra do Frade e o
majestoso Farol de Santa Marta, além do imenso conjunto arquitetônico tombado
como Patrimônio Nacional pelo IPHAN. A despeito disto tudo e dos investimentos
realizados pelo Governo Federal no restauro de vias e fachadas, o poder público
municipal trata os equipamentos culturais de Laguna com um descaso criminoso.
Na última sexta-feira
estive visitando a Biblioteca Pública Municipal Professor Romeu Ulysséa,
abrigada em um prédio construído em 1864. Apesar da dedicação dos seus
funcionários, já na entrada é possível perceber que a biblioteca está
abandonada a sua própria sorte. Poucas estantes, acervo defasado, caixas com
livros espalhadas pelo espaço, equipamentos obsoletos e falta de investimentos.
Não à toa, torna-se cada vez menos procurada pelos leitores.
No Museu Histórico
Anita Garibaldi a realidade é ainda mais deprimente. O prédio, tombado pelo
IPHAN, sede do governo da República Juliana em 1839, está restaurado e em bom
estado de conservação. Já o acervo e o atendimento ao público, sob gestão do
município, deixam indignados os visitantes minimamente exigentes. O atendimento
é feito por adolescentes que desconhecem a história do local, da cidade e das
peças expostas. Praticamente não há monitoramento e se observa claramente que
os atendentes não passaram por qualquer tipo de treinamento. As coleções são
confusas, com peças de diferentes contextos misturadas e sem material
interpretativo. Se existe um plano museológico, este então não foi aplicado.
Apesar da importância e do valor histórico de algumas peças, tudo é muito
caótico e o acervo não conta com cuidados mínimos de conservação, exposto à
claridade solar, à umidade, ao vento e ao alcance das mãos.
Por fim, o Morro da
Glória, onde está instalado o monumento de Nossa Senhora da Glória, esculpido
em 1953 e assinado pelo escultor Alfredo Itaege. A vista que se tem da cidade
de Laguna e de toda a região do alto do Morro da Glória é lindíssima. Pena que
o monumento dispute espaço com as inúmeras torres de telecomunicações e que o
abandono do local seja gritante. Sujeira, mato, ausência de sinalização. É
tanto mato que partes do mirante tornam-se inacessíveis aos visitantes. Uma
lástima!
Quando vemos o estado
a que estão relegados os equipamentos culturais e turísticos sob gestão do
poder municipal, percebemos o quão distante a região está de se transformar em
uma referência em serviços turísticos, como pretende o projeto proposto pelo
SEBRAE e que articula Laguna a Imbituba e Garopaba.
Laguna, por toda a sua
importância e referência simbólica na história brasileira, precisa rever
urgentemente sua política de gestão e conservação do patrimônio cultural.
Afinal, nenhuma cidade sobrevive apenas de fachadas.
*
Historiador e Professor do IFSC
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