Ele e eu
* Por
Eduardo Oliveira Freire
Saiu de casa. Deixou
um bilhete. Tinha algumas economias, havia trabalhado na quitanda do seu pai.
Foi para a rodoviária e pegou qualquer ônibus que o levasse para longe.
“Estou cansado. Voltei
para casa. A mãe me recebeu com muitos beijos. Vinte anos foi muito papo em um
dia só. O pai não quis falar comigo, está magoado. Pedi para trabalhar outra
vez na quitanda. Fez cara feia, mas deixou. Aparentemente é um homem rude, porém
quando soube que cheguei, comprou um monte de carne, sabe que adoro churrasco“.
Fez de tudo. Foi peão,
pedreiro e garimpeiro. Passou momentos intensos. Uma vez, teve um caso com uma
mulher casada e o marido o feriu com o facão nas costas. Foi a primeira
cicatriz entre tantas. Machucou-se quando tentou montar um cavalo bravo e levou
um tiro no garimpo, quando um colega viu-o encontrar uma valiosa pepita de
ouro.
“Estou ajudando
muito meu pai. Vou aos fornecedores para
abastecer a quitanda. O velho já pode dormir de tarde. Tomo conta de tudo. Um
dia, encontrei Rosa, está tão
bonita. Fingiu que não me viu”.
Estava deitado na cama
e ao lado uma mulher roncava. Não conseguiu amar ninguém. Sempre pensava em
Rosa. Era muito tímida e criada pela avó rigorosa. Trocavam olhares, um colega
percebeu e contou para os outros rapazes. Todos ficaram zombando dele. Mentiu,
disse que não se interessava por ela. Os amigos fizeram uma aposta. Aceitou. Rosa no início tentou resistir, mas
não conseguiu esconder os sentimentos. Quando transaram na mata, os outros
presenciaram tudo. Quando Rosa descobriu, fugiu para casa de uma tia.
“Tentei conversar com
Rosa, que foge sempre. É viúva e tem dois filhos. Sempre a encontro indo à
igreja. Uma vez, um dos seus filhos caiu
de bicicleta perto da quitanda e machucou o joelho, fui levá-lo ao posto
médico. Ela estava no trabalho, era professora. Quando me viu com o seu filho,
agradeceu-me. Disse que se eu precisasse de alguma coisa, era só pedir.
Respondi-lhe: ‘Se você puder me perdoar algum dia...’”.
Sozinho, olhou para o
espelho. Não se reconheceu.
“Fiz até serenata...
Ela viu que estava diferente. Começamos a namorar. Tempos depois casamos”.
Morreu. Retornou para
casa.
“Nasci de novo.
Continuei a trabalhar com o pai. Rosa espera um filho meu e me dou muito bem
com os seus filhos. No domingo, a minha mãe prepara um delicioso almoço para
todos“.
*
Formado em Ciências Sociais, especialização em Jornalismo cultural e aspirante
a escritor - http://cronicas-ideias.blogspot.com.br/
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