Platão foi educador por excelência
"A educação deve possibilitar ao corpo e à alma toda a
perfeição e a beleza que podem ter". Foi dessa maneira que Platão
estabeleceu, de forma direta, sumamente objetiva, sem subterfúgios e nem
solilóquios, em poucas palavras, a real finalidade desse processo, tão
comentado e teorizado, mas tão pouco compreendido, posto que essencial para a
formação humana. Ele via no filósofo não um teorizador, a lidar com complexas idéias
abstratas, como muitos entendiam (e ainda hoje entendem), mas, sobretudo, um “educador”.
Todavia em sentido amplo, holístico, completo, envolvendo a integralidade
humana. Ou seja, levando em conta, simultaneamente, corpo e mente (que chamou
de “alma”), já que um não existe sem o outro.
Para Platão, educação era algo muito além do que é
compreendido hoje, universalmente (salvo raríssimas exceções). Ou seja, como
mera forma de “adestramento” das pessoas para exercerem as diversas profissões
que exijam conhecimentos específicos, como sempre entenderam e ainda entendem
os responsáveis por políticas educacionais mundo afora. Fiel a essa sua visão,
ele criou, em uma área nobre que havia recebido por herança, uma de suas
principais obras, que só rivaliza em importância com suas idéias filosóficas,
que foi a Academia. Ouso afirmar que se tratou da primeira escola superior da
história. E foi tão preciosa, que lhe sobreviveu, e muitíssimo. Durou quase um
milênio!!! Ademais nunca foi nem remotamente igualada em excelência, quer em
seus métodos, quer em seu objetivo: o de “possibilitar ao corpo e à alma toda
perfeição e beleza que podem ter”.
O filósofo e escritor norueguês Jostein Gaarder destaca, em
seu best-seller mundial “O mundo de Sofia”, qual era a principal característica
dessa instituição, que a diferenciava de todas as outras, tanto as que vieram
antes, quanto as criadas depois dela: “ Na Academia de Platão ensinava-se
filosofia, matemática e ginástica. ‘Ensinar’’ talvez não seja o verbo mais
adequado. Na Academia de Platão o que mais importava também era o diálogo vivo.
Não foi por acaso que Platão escreveu seus textos em forma de diálogos”. Não
havia, pois, como nas escolas tradicionais, a figura de um “professor”, em
contraposição a alunos. “Todos” participavam – cada qual de acordo com as
informações que dispunha – da busca do conhecimento. Pelo menos durante o tempo
em que Platão comandou a Academia, esta não dispunha de qualquer doutrina
especial para ensinar. Em vez disso, o filósofo (e provavelmente outros
associados a ele) passavam problemas a serem estudados e resolvidos conjuntamente.
A filósofa gaucha Neiva da Silva Martinelli observa: “ (...)
A filosofia é realizada na Academia... pela oralidade, a vida comunitária é
regida pelos discursos e diálogos, pela educação da alma. O método socrático e
a matemática (fonte em Pitágoras) são ciências necessárias à formação do
filósofo, sendo que a matemática revela ordem, harmonia, fornecendo uma visão
de perfeição do mundo inteligível”. Em outro trecho de seu excelente ensaio a
propósito dessa modelar escola, ela destaca: “A Academia objetivava formar
novos homens, no sentido transformador do amor ao bem, num ato de sublimação,
visando o tornar-se virtuoso pela ação. O filósofo é aquele que escreve na
alma. E o verdadeiro conhecimento é universal, refletido em si mesmo e de si
toma consciência. Por isso nos diálogos há o comum acordo, onde se superam os
pontos de vista individuais. Entretanto havia a liberdade de pensamento, de
expressão. O fundamento da escola era o ato do diálogo, visto e tido como um
modo de vida, pois o mesmo conduz à transformação do ser humano”. E não conduz?!
Neiva da Silva Martinelli lembra, ainda: “Platão diferencia
os dois tipos de escrita que podem ser impressas: a escrita gravada na alma dos
homens, e a escrita nos rolos de papel. E ele considera filósofo aquele que
tenta escrever na alma dos homens. Por isso, atribuía grande importância à
oralidade. Os escritos em papel são passíveis de diferentes interpretações, e
capazes de despertarem os mais variados sentimentos. Uma palavra escrita que
está simplesmente impressa em papel aparente, corresponderia, a uma cópia da
cópia. Por isso, a alma tem tanta dificuldade de reconhecer, de lembrar-se do
verdadeiro conhecimento”.
A Academia não fazia distinção de sexos. Ou seja, homens e
mulheres recebiam a mesmíssima educação, inclusive a física. Ademais, pelo
menos na gestão de Platão, era gratuita. Não cobrava mensalidade de ninguém. O
professor Márcio Ferrari enfatiza, com rigorosa pertinência: “Platão acreditava
que, por meio do conhecimento, seria possível controlar os instintos, a
ganância e a violência. O acesso aos valores da civilização, portanto,
funcionaria como antídoto para todo o mal cometido pelos seres humanos contra
seus semelhantes. Hoje poucos concordam com isso; a causa principal foram as
atrocidades cometidas pelos regimes totalitários do século 20, que prosperaram
até em países cultos e desenvolvidos, como a Alemanha. Por outro lado, não há
educação consistente sem valores éticos. Você já refletiu sobre essas questões?
Até que ponto considera a educação um instrumento para a formação de homens sábios
e virtuosos?”. Sim, leitor, até que ponto?
Boa leitura.
O Editor.
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