sábado, 11 de julho de 2015

Eu encontrei o sentido da vida


* Por Rodrigo Ramazzini


No divã. Primeira sessão de análise. Depois de uma conversa de introdução, os laços de confiança começam a aparecer e os assuntos entram em um tema mais complexo...

- Doutor! Preciso ser sincero com o senhor. Jogar limpo desde o início. Eu só estou aqui porque estava pensando seriamente em me matar. Minha vida não faz mais sentido... Comentei isso com uma amiga e ela, que é sua paciente, me aconselhou a procurá-lo...
- Entendi. Fales mais sobre isso...
- Ela disse para eu lhe dar uma chance, de ter a oportunidade de conversamos ao menos uma vez que, com certeza, eu mudaria de ideia... Por isso estou aqui...
- Entendi. Fales mais...
- Por mim, eu não viria...
- Sim.
- Logicamente que, além de aconselhar sobre a sessão, ela me encheu de xingamentos pela besteira que, segundo sua ótica, eu estou prestes a fazer...
- Por que a vida perdeu o sentido?
- Não sei ao certo, Doutor. De um tempo para cá, não vejo mais sentido em viver. Não vejo perspectiva em nada. Não tenho ambição de nada. O desânimo me vence a cada manhã. Os meus dias são vazios e tingidos de preto e cinza. Tudo parece conspirar contra, apesar de que, ultimamente, eu tenho me importado pouco com o que acontece comigo... Tanto faz, tanto fez... Então, me diz: para que continuar vivo? Qual o sentido de continuar vivo?
- Entendi.
- Não tenho razão, Doutor?
- Deixa eu te fazer uma pergunta: já paraste para pensar o porquê estás aqui?
- Como assim, Doutor?
- Qual a tua missão na terra?
- Ah, para Doutor! Um cara como eu só está aqui na terra para sofrer. É a minha única missão. Não tenho sucesso em nada na vida... No trabalho, sou um fracasso... No amor, idem... Aquisição de bens materiais, também... Todos os dias, tem uma notícia ruim... Enfim... É muita desgraça para um homem só... Eu não aguento mais!
- Todos nós temos uma missão na terra. Volto a perguntar: já achaste a tua missão na terra?
- Doutor! Se eu tivesse uma missão não passava por tantos fatos ruins diariamente... Parece que eu atraio coisa ruim... Tudo de ruim acontece comigo...
- Sei...
- E me compara com as demais pessoas e chegaremos ao resultado que sou um nada... Um nada! Uma vida inteira para nada! Uma vida sem sentido! E Deus, se é que ele existe, parece que desistiu de mim...
- Só para recapitular. Estás passando por um momento ruim? Por fatos desagradáveis? Tu olhas para a vida dos outros e parece tudo bem? Tudo evoluindo? Enquanto a tua vida...
- Isso mesmo, Doutor! Exatamente isso!
- Aprenda que os fatos que vivenciamos fazem parte da nossa escalada evolutiva de aprendizado. Como cada ser está em uma etapa deste processo e tem uma missão específica designada para a vida, somos criaturas completamente diferentes umas das outras. Assim sendo, esqueça os demais e volte-se para dentro de si mesmo. Descubra a tua missão e terás um sentido para a vida.
- Mas, Doutor! É que eu...
- Ah! E para completar, preciso lhe dizer que nada acontece por acaso em nossas vidas. No entanto, para entender o hoje, talvez, só seja possível no futuro, quando ao se olhar e interpretar o passado é que os pontos se ligarão e tudo fará sentido. Portanto, se estás em dificuldade, comece por acreditar que irá superá-la. Mude o foco e a forma de pensar. Tudo tem um motivo e não há tempestade que dure para sempre. Não é assim? Vais me dizer que, quando olha para a própria história, o que eu falei não faz sentido?
- Doutor! Eu...
- A nossa luta diária é com nós mesmos, meu caro! Não estamos competindo com ninguém a não ser nós mesmos. Nós somos os nossos maiores amigos e inimigos ao mesmo tempo. Por isso, questione-se, interprete os sinais dos acontecimentos, perdoe-se, mude, vença os seus medos, desafie-se, descubra-se! Ao final, com certeza, já queres tanto deixar a terra, ao menos terás saído muito mais evoluído do que no começo da jornada... Não achas?

Foram quatro minutos de silêncio no consultório até a conversa ser reiniciada...

- Tenho uma proposta: antes de tu te matares, já que assim desejas, eu te desafio a retornar ao meu consultório daqui a uma semana com a resposta da questão: qual é a tua missão na terra? Qual o sentido da tua existência? Reflita sobre tudo o que eu te falei e traga a resposta. Mas, tem que ser uma resposta convincente, viu? Depois, tu fazes o que quiseres da vida. Aceitas o desafio?
- Deixei-me pensar... Está bem. Eu aceito, Doutor!
- Apenas lembre-se e leve em consideração durante a tua reflexão que, não necessariamente, o sentido da vida está em algo grande. Por exemplo: tem gente que nasce para cuidar dos outros, outros para fazer as pessoas rirem, outros para transportar alimentos, outros para cantarem em bar, outras para serem mães... Enfim, a lista seria grande...
- É.
- Te espero daqui a uma semana. Ok?
- Ok, Doutor!
- Não vá fazer nenhuma bobagem até lá, ok? Consulta encerrada...
- Ok. Vou tentar não fazer...

A segunda consulta entre o paciente X. e o Doutor Stephen nunca aconteceu.

Hoje, completa-se nove meses da primeira consulta. Hoje, também, é o lançamento do livro escrito por X., intitulado “Eu encontrei o sentido da vida”, que narra a história de um paciente, com conflitos existenciais, e um Doutor que o auxilia a beira de um divã a retomar a vida.

As letras deram sentido a sua existência...

Na dedicatória do livro está escrito:

“Tudo devo ao Dr. Stephen. Gratidão eterna!”

O convite 01 da sessão de lançamento do livro foi remetido ao Dr. Stephen, que ao lê-lo, deixou uma lágrima de satisfação escorrer pelo rosto. Tinha cumprido mais uma etapa da sua missão de vida...



* Jornalista e contista gaúcho 

Um comentário:

  1. Pareceu-me fácil demais. Faço psicanálise há 14 anos e ainda não encontrei o sentido da vida. E olha que antes dela, já tinha feito psicoterapia por dois anos.

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