O gosto do nada
* Por
Charles-Pierre Baudelaíre
Morno espírito, antigamente afeito à luta,
a Esperança que te esporeava outrora o ardor,
não te cavalga mais! Deita-se sem pudor,
cavalo que tropeça em tudo e em vão reluta.
Dorme, ó meu coração; desiste, ó massa bruta!
Espírito vencido, em ti, velho impostor,
já não tem gosto o amor, nem o tem a disputa;
não mais a voz do cobre ou da flauta se escuta!
Deixa esta alma sombria, o Prazer tentador!
Perdeu a Primavera o seu cheiro de flor.
E o tempo me devora em marcha resoluta,
como a ampla neve um corpo rijo de torpor;
contemplo do alto o globo túmido e incolor;
e nele nem procuro o abrigo de uma gruta!
Vais levar-me, avalancha, em tua queda abrupta?
Tradução de Guilherme de Almeida..
*
Poeta francês do século XIX, um dos precursores do Simbolismo.
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