Como extrair o melhor de Shakespeare
As peças de William Shakespeare foram escritas para serem
encenadas no palco e não para serem livros. Certo? Creio que certíssimo!!! A conclusão me parece
lógica e, mais do que isso, óbvia. Não fosse assim, as histórias que contou
seriam redigidas em forma de romance e não de peças teatrais, concordam?
Todavia, há tamanho conteúdo filosófico e comportamental nas falas que criou
para seus personagens, que a melhor maneira de aproveitar a genialidade do
bardo inglês é a de apreciá-lo duplamente. Ou seja, assistindo a encenação de
suas peças e, posteriormente, lendo-as. Contudo, essa leitura não pode ser
feita com toda a atenção concentrada exclusivamente no enredo. Para isso, para
apreciar apenas a história, o ideal é assistir sua representação no teatro.
Porém, para extrair toda a sabedoria e beleza de suas observações, nada como a
leitura. E acompanhada de uma caneta ou lápis, para grifar as principais
citações. Creiam-me, estas não faltam. Pelo contrário, abundam.
Raramente encontrei em peças de outro autor teatral tanta
coisa que me fez refletir, sobretudo sobre amor, ciúmes, traição, vida, morte,
e vai por aí adiante. Nesse aspecto, Shakespeare é imbatível. Confesso (e essa
confidência não fiz para ninguém, até hoje, pela certeza de ser incompreendido),
que pela primeira vez que li um livro do bardo inglês, detestei. Achei-o
monótono, empolado, repetitivo e até um tanto piegas. Só que, quando fiz essa
primeira leitura, eu nada entendia da vida e muito menos de literatura. Pudera!
Tinha, apenas, treze anos de idade. Tudo começou a mudar sete anos depois,
quando tive a oportunidade de assistir, pela primeira vez, a uma peça de Shakespeare,
encenada em um teatro de São Paulo. E foi, justamente, “Romeu e Julieta”.
Após essa experiência, lembrei-me que tinha esse livro e que
o havia detestado quando o tinha lido. O que fiz? Decidi fazer a releitura
(hábito que adquiri desde então e que mantenho até hoje). Só que, ao contrário
do que havia feito antes, quando todo o foco da minha atenção se concentrara no
enredo, passei a analisar o conteúdo das “falas”. Cada uma que eu desconfiava
haver uma mensagem de vida, li e reli várias vezes, meditando a respeito. Só
então consegui testemunhar a genialidade de Shakespeare. Depois disso, adquiri
os livros de várias outras peças, até poder contar com a totalidade de sua obra
teatral. Nem todas as peças eu pude ver encenadas no teatro, até porque, muitas
delas nunca o foram (pelo menos não em São Paulo, onde eu residia).
Eu andava um tanto envergonhado por haver detestado “Romeu e
Julieta” quando a li pela primeira vez, mesmo que isso tenha acontecido quando
eu tinha só treze anos de idade. Cheguei a contestar, intimamente, apenas por
isso, meu bom gosto literário, mesmo que tivesse me retratado sete anos depois.
Esse sentimento íntimo, todavia, mudou em 2012. Foi quando li, no portal da
Editora Saraiva, matéria assinada por Andréia Silva, publicada em 6 de julho
daquele ano, tratando do lançamento do livro “Quem escreveu Shakespeare?”, do
professor norte-americano James Shapiro. Ele estava no Brasil para participar
da décima edição do Festival Literário Internacional de Parati e aproveitou a
ocasião para fazer esse lançamento editorial. Recorde-se que esse escritor é
tido e havido como um dos maiores especialistas no mundo da obra do bardo
inglês.
E por que me conformei com o “pecado mortal” literário da
minha adolescência ao ler a citada matéria? Porque constatei que aquela primeira
impressão que tive há tanto tempo e que tanto me envergonhou, não era exclusivamente
minha. O ilustre professor confidenciou à Andreia Silva: “Quando li, eu
detestei Shakespeare”. Eureka! Eu não estava sozinho! Estava na companhia de um
dos mais ilustres e acatados mestres de literatura. E mais, especialista na
obra de Shakespeare. Outra coincidência, foi a idade em que Shapiro leu, pela
primeira vez, uma obra do genial dramaturgo (e detestou-a). “Eu tinha 13 anos
quando estudei Romeu e Julieta. Eu não entendi, não gostei. Mas resolvi que
estudaria Shakespeare de novo”, disse Shapiro. Ou seja, agiu exatamente como
eu, sem tirar e nem pôr.
Andreia Silva esclareceu o que foi que fez o ilustre
professor mudar de idéia; “O encantamento de Shapiro com as histórias do autor
de Otelo, Rei Lear, Hamlet, entre outros, deu-se quando ele assistiu às peças
durante uma temporada com o irmão em Londres. ‘Foi quando eu experimentei
Shakespeare’”. Na citada matéria do portal da Editora Saraiva, escrita após
descontraído bate papo entre a autora e o professor norte-americano, foi
levantada a questão da (para mim) estúpida dúvida sobre a autoria das peças e
sonetos do bardo inglês, aliás, tema de seu livro. E Shapiro declarou: “Não
entendo essa ideia de que as pessoas comuns não possam ser extraordinárias.
99,9% das pessoas extraordinárias são comuns”. E não são?!
O curioso é que esta é a mesmíssima opinião expressada pela
doutora Mara Narciso, ao comentar um dos meus textos sobre o genial dramaturgo.
E sem ler a matéria de Andréia Silva, o que não me admira e nem me surpreende
levando em conta a inteligência e a sensibilidade da nossa colunista do
Literário. Shapiro arrematou, em tom de
brincadeira, a conversa: “Meu trabalho é tornar doloroso para essas pessoas
pensarem dessa forma”. Tomara que consiga. Burrice também tem limites! Ou
deveria ter... Claro que foi Shakespeare quem escreveu Shakespeare!!!!
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Imersa em suas considerações, tomei um susto aqui. Foi como se de repente, ao assistir um filme, eu me visse na tela.
ResponderExcluir