Ausências catastróficas
Há três características essenciais cuja
ausência, se houver, nos será catastrófica: inteligência, sentimento e vontade.
Todas têm que estar presentes simultaneamente, para nos tornar úteis,
produtivos e humanos. Se faltar uma delas, mas contarmos com as outras duas,
ainda poderemos nos defender, posto que não muito bem. Sem as três, contudo,
seremos piores do que os mais obtusos animais.
A inteligência nos capacita a entender
quem somos, onde estamos e a que viemos. Conheço pessoas que são, digamos, um
tanto obtusas, com capacidade de entendimento beirando o grau zero. Seu
quociente de inteligência, o tal do QI, é bem abaixo da média. Todavia, são
extremamente emotivas, e com emoções positivas, por isso, contam com um círculo
enorme de afetos. Dotadas de vontade férrea, recebem orientação de parentes e
amigos e acabam se dando bem.
Os sentimentos nos aproximam dos
semelhantes, numa troca mútua e benigna de emoções. Conheço, igualmente, muitos
que, além de curtos de inteligência, são verdadeiras pedras de gelo em termos
de emoções. Não se empolgam e nem se emocionam com nada e ninguém. Têm tudo,
pois, para serem perdedoras e se virem marginalizadas na sociedade. Contam,
porém, com um fator que considero essencial, irresistível, capaz de realizações
notáveis e feitos surpreendentes: a vontade.
Com ela, superam limitações mentais e
afetivas, caem, caem e caem (sucessivamente), mas jamais se dão por vencidas.
Levantam, “sacodem a poeira e dão a volta por cima”. A determinação é seu
grande recurso para enfrentar (e quase sempre vencer) tudo e todos. São pessoas
que, sobretudo, agem. Pois é a vontade que nos mobiliza à ação.
Podemos, é verdade, sobreviver sem a
inteligência, mas então andaremos às cegas pelo mundo. Sem sentimentos, não
teremos motivação para fazer o que quer que seja. E sem vontade, não passaremos
de parasitas vivendo às custas alheias. Como se vê, a ausência de uma dessas
características, se não nos incapacita de vez, limita as nossas chances de
sucesso e até (ou principalmente) de felicidade.
Sou, por força das atividades que
exerço – de jornalista e escritor – persistente e incansável observador de
pessoas. Claro que não tenho como saber o que realmente pensam ou sentem.
Ninguém tem essa capacidade. Observo, porém, seu comportamento, suas atitudes,
suas ações face diversos desafios e como fazem para tentar para superar
dificuldades.
Mesmo que não queira e, não raro me
sinta constrangido, sou, na verdade, grande bisbilhoteiro. É dessas observações,
contudo, que pinço, por exemplo, os personagens dos meus contos e novelas. Daí
sua verossimilhança, característica minha que chama a atenção dos críticos que
a consideram minha maior virtude. Em termos de personagens, não crio nada.
Limito-me a “copiar” os bilhões que existem por aí.
Conheço pessoas de inteligência
brilhante. Têm capacidade de compreensão muito acima da média e criatividade de
causar inveja aos mais hábeis e consagrados artistas. Além de inteligentes, têm
sensibilidade à flor da pele. Emocionam-se com facilidade e não têm vergonha de
expressar emoções. Riem quando sentem vontade, choram se for o caso de chorar,
irritam-se e não dissimulam a irritação, enfim, têm sentimentos e não relutam
em expressá-los.
À primeira análise, têm tudo para serem
vencedoras. Mas... algumas não são. Por que? Porque lhes falta um fator que
julgo essencial: vontade. São fantásticas planejadoras, mas na hora de colocar
os planos em
prática... Despertam simpatias, mas nunca aprofundam
relacionamentos. São criativas, mas não sabem o que fazer com tanta
criatividade. Desperdiçam oportunidades atrás de oportunidades e sempre têm uma
desculpa engatilhada, na ponta da língua, para explicar esse desperdício.
Tempos atrás, escrevi uma crônica sobre
um amigo que é assim. O sujeito conta com um talento inato de escritor. Cria
histórias com desfechos surpreendentes, mas nunca as põe no papel. Perdem-se,
todas, ao vento, nas narrativas que faz aos companheiros de bar, onde passa
dias inteiros, sem fazer absolutamente nada, a não ser jogar conversa fora.
A mulher, ingênua, confia em seu
talento e trabalha feito uma escrava para sustentar a casa e os caprichos e a
vagabundagem do genial marido, eterna “promessa de escritor”. Mas nunca passou
(e duvido que passe) disso: mera promessa.
Lamento quando vejo casos assim, já que
não há tanta abundância de talentos no mundo que se possa desperdiçar um tão
palpável, apenas por falta de vontade. Sem se dar conta, essa pessoa deixa de
ser livre. No caso, é escravo da mulher.
Caso essa opte, um dia, pela separação
(e é o que julgo que fatalmente, em determinado momento, vai acontecer), esse
meu amigo estará num “mato sem cachorro”. Sabe, é verdade, como se sustentar. Mas
não quer. Prefere morrer à míngua. E não se trata de nenhum doente. Tem saúde
para dar e vender.
O médico argentino, naturalizado
brasileiro, Idel Becker, completa esse raciocínio, ao ponderar: “Sem
inteligência, o homem é cego; sem sentimento, inerte; sem vontade, escravo”. A
ausência dessas três características, principalmente quando simultânea, é ou
não é, pois, catastrófica?! É catástrofe maior do que o choque de um meteorito
ou cometa com a Terra.
Boa leitura!
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Uma formulação convincente.
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