O tempo da política passa
devagar
* Por Marcos Alves
Foi uma eleição morna. Apesar da
expectativa criada com o debate da Band, quando o candidato Alckmin apareceu
aos olhos do país com uma postura arrojada, os números permaneceram favoráveis
a Lula até a totalização dos votos. O termômetro desse marasmo foi o plantão de
domingo na redação. Os flashes entraram no horário, salvo alterações de última
hora, geralmente de ordem técnica ou por falta de assunto mesmo. Minas não teve
segundo turno para governador e a atenção foi para os números de Brasília.
Pouco estresse, nenhuma surpresa.
Salvo no dia da divulgação da
primeira pesquisa posterior ao debate quando embarquei numa pegadinha.
Assessores e militantes do PT acompanhavam um político do partido que dava
entrevista na emissora onde trabalho. Eram oito e meia da noite, fim de
expediente para mim. Na saída, cumprimentei o grupo e um deles puxou conversa.
Falei sobre o debate e ele me disse que na primeira pesquisa a ser divulgada
ainda naquela noite, Geraldo Alckmin apareceria a 8 pontos de Lula. Foi o que
lhe acabara de dizer um amigo que ligara de Brasília.
No trajeto do trabalho para casa
que fiquei pensando no significado da virada que se anunciava. O escândalo do
dossiê surgiu como o fato novo que iria provocar a ruptura definitiva no
projeto da reeleição. Como iriam ficar as composições políticas a partir desse
quadro novo? Como seria a vitória de virada de um candidato que se lançou como
desconhecido na maior parte do Brasil e agora derrotava o maior líder popular
surgido nas últimas décadas? É a
corrupção, esse câncer, fazendo mais um estrago. Mas ao abrir o apartamento
ouço minha mulher dizer que Lula ampliara a vantagem.
Foi o bastante para todas aquelas
projeções e conjeturas feitas a caminho de casa desmancharem como farofa. Nada
de novo. E assim foi até o último domingo, em um plantão chato. Por volta de
meio-dia passei na casa da avó para deixar as crianças.
Família reunida à mesa, mas
dividida politicamente. Uns a favor de Lula, outros de Alckmin. A discussão
esquentou quando surgiu o assunto do imposto de renda. Os tucanos reclamaram
que o dinheiro vai para o Bolsa-família ou para sabe-se lá onde. Os petistas
disseram que pelo menos está sendo aplicado no social.
A massa estava ótima e o frango
também. A costela assada, meu Deus, me deixaria em estado de banzo avançado,
impróprio para encarar a maratona de telefonemas, laudas e fitas que aquela
tarde anunciava. Despeço-me da turma que tem o dia livre e parto para outra,
isso mesmo, outra eleição. Mais uma, e confesso que não desgosto de tudo.
Há alguns anos, cobri uma eleição
municipal em que o terceiro colocado nas pesquisas conseguiu uma virada
espetacular nas urnas. Dizem que foi por causa do único debate, feito uma
semana antes do pleito, em que ele se manteve cordial e sorridente enquanto os
favoritos trocaram farpas, para não dizer ofensas o tempo todo.
Voltando à eleição de Lula, nos
próximos quatro anos o Brasil vai crescer, indiscutivelmente. Para todos os
lados, em todos os sentidos. A economia estável protege o capital, o setor
produtivo também se beneficia. Esse é o Brasil dos números.
No Brasil das pessoas, a situação
é pior por causa da miséria, visível nos mendigos das pontes e viadutos, no
grau de carência das massas beirando o colapso, na indiferença dos grandes
condomínios, na esterilidade das promessas dos políticos e da grande mídia, tão
bem feita quanto distante da realidade da maioria das pessoas.
A despeito disso e voltando aos
debates gostei mais do último, quando os candidatos ficaram feito touros em uma
arena cutucados pela platéia. Chegaram mesmo quase ao contato físico, em alguns
momentos. As perguntas dos convidados não trouxeram qualquer novidade, mas o
formato ficou interessante. Evoluímos todos com o processo democrático.
(Texto que trata das eleições
presidenciais de 2006).
* Marcos Alves é jornalista.
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