A saudade do que não houve
* Por
Donald Malchitzky
Bufê completo, com
várias opções de saladas e pratos quentes,
dois tipos de carne grelhada na hora, mais 500 ml de suco natural, tudo por R$ 2,50 é
barato, não é? Só falta saber onde!
A bobagem ilustra bem o
desejo da volta da ditadura militar, expresso por bom número de pessoas que
sequer viveram aqueles dias cinzentos.
Esclarecendo: o nome ficou, mas
havia muitos militares patriotas que não concordavam com os descalabros.
Essas pessoas não sabem
ou não querem saber dos intelectuais, professores, artistas, pesquisadores,
estudantes, democratas, opositores, trabalhadores que foram sequestrados,
presos, torturados da forma mais vil, e
muitos deles mortos covardemente sem qualquer direito de defesa. Nunca ouviram
falar das invasões dos lares, da apreensão de pessoas e de livros julgados
“subversivos” pelo idiota de plantão.
Acreditam que a
“Redentora” foi uma revolução pacífica e ordeira, sem saber das atrocidades mil
cometidas pelos traidores, digo, “vencedores”, e, principalmente, que tudo foi
cometido contra pessoas indefesas, sem capacidade de resistência.
Dizem que todos os
opositores eram terroristas que esquartejavam criancinhas, pois não sabem que o
terrorismo foi uma ação de desespero de um pequeno número de pessoas. Usam como argumento que comunistas foram
treinados em Cuba e na União Soviética, o que é verdade, de novo, para um
número ínfimo; mas esquecem dos milhares de “democratas” treinados nos Estados Unidos, inclusive em
táticas de tortura.
“Ah, mas havia
segurança”, dizem. Tanto havia que era preciso chamar o ladrão para nos
proteger da polícia, como dizia Chico Buarque. Afirmam que não havia corrupção,
embora ela fosse quase endêmica, mas ai de quem denunciasse algo. O comércio
era proibido de abrir suas portas aos domingos, os postos de gasolina aos
sábados e domingos. A centralização de
decisões era tanta, que o ministério chegava a se reunir para determinar o
preço das corridas de táxi em centenas de cidades.
As dívidas externa e
interna chegaram à estratosfera, o
Brasil estava entre quem pagava as maiores taxas de juros por empréstimos
internacionais no mundo e a inflação saiu num galope tal que ficou incontrolável.
Foram muitos os
pecados, mas a perseguição a estudantes, não permitindo que entre eles se
formassem líderes capazes e aos cientistas, fazendo com que a grande maioria
saísse do Brasil, expulsa, fugida, perseguida, é eternamente indesculpável: até
hoje não voltamos a criar líderes capazes e confiáveis e, na área científica, o
atraso é fenomenal.
Tudo e muitíssimo mais do que está escrito acima
está devidamente documentado, diferentemente do combustível dessa saudade sem
nexo.
*
Escritor
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