terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Uma página de Proust

* Por Evelyne Furtado

Pois bem, eu lia Proust e me despedia de novembro. O livro em questão traz na folha de rosto a data em que o comprei: 10.12.1984.

A memória resgata a frustração que senti frente ao discurso do escritor francês. Uma pontada no orgulho da leitora voraz que eu era.

Aí já expresso o motivo da dificuldade. Proust não é leitura para ansiosos. Não é prato para glutões. Muito menos para uma jovem recém-casada, entrando na casa dos vinte anos, estudante de direito e trabalhando dois expedientes.

Para ser honesta, o casamento recente, o trabalho e a faculdade de direito são desculpas esfarrapadas. Na verdade a minha alma alvoroçada e a imaturidade eram os reais impedimentos.

Proust requer paciência, método e muita sensibilidade. O leitor que deseja ação perde-se nas descrições e nas vírgulas do mestre estilístico.

Proust também exige compreensão das diferenças de classe sociais tão bem detalhadas nas suas narrativas e coragem para mergulhar no mar revolto do inconsciente.

O francês tece com delicadeza e precisão forma e conteúdo. Vai das firulas do trato social às profundezas da alma com a mesma precisão.

Bem, eu dizia que lia Proust na madrugada. Hoje me confesso mais paciente e madura. Em meio aos textos acadêmicos que sou obrigada a ler - agora cursando Psicologia - procuro tempo para degustar pelo menos uma página de Proust por dia.

Continua não sendo fácil. Não é o meu escritor preferido. Não sou a ideal leitora de Proust. Permaneço inquieta, ainda, mas vou além das Madeleines e sou tomada por trechos que me tiram o fôlego de tanta beleza. Sou afetada pela luz de Paris e pela surpresa do tempo que volta resgatando o que imaginamos perdido.

Lia Proust na madrugada na qual dezembro começou. Não sei se lerei outros volumes de Em Busca do Tempo Perdido. Corro para viver o tempo presente, com um pouco mais de calma, como requer Proust e os melhores nacos da vida. Mas retorno aos quinze anos onde olhos de dezenove me esperam no portão.


* Poetisa e cronista de Natal/RN

2 comentários:

  1. Que crônica linda, Evelyne. Clareou as leituras difíceis, não só de Marcel Proust, mas muitas outras. Amei a sua comparação com glutonice e voracidade. Ah, no caso é preciso parcimônia, Avidada, vou tentar conter-me e ler Proust. Com o club de Leitura, estou aprendendo a ler os livros necessários.

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  2. Eu certamente não lerei Proust. Sou impaciente.
    Todavia seu texto me encantou. Parabéns, Eve!!
    Beijos
    Lu

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