sábado, 17 de março de 2018

Repórter tem que ser poliglota - Edmundo Pacheco


Repórter tem que ser poliglota


* Por Edmundo Pacheco



Se você sonha em ser repórter (não importa o veículo), esteja preparado para tudo, mas tudo mesmo. Primeiro, você tem que ter uma noção muito forte de relações humanas; depois, precisa saber falar e entender as muitas línguas que falamos. Não se trata simplesmente de gramática, e não estou falando apenas de expressão oral, mas de todo o conjunto de fatores que envolvem a comunicação e você deve saber que nesta relação a linguagem oral representa apenas 9% (lembra mesmo? Diz ai como é a fórmula então?).

Trata-se de falar a mesma linguagem do seu interlocutor e de ter um comportamento compatível com a língua que você está falando.  Você não pode conversar com um médico na mesma língua que fala com um pedreiro (não estou desmerecendo nenhuma profissão, por favor). Não pode entrevistar um presidiário da mesma maneira, e no mesmo nível, que um político (a menos que sejam a mesma pessoa, o que é difícil, né?).

Não pode falar e se comportar profissionalmente da mesma maneira como fala e se comporta em casa ou num grupo de amigos. Há várias línguas aí fora e, pra ser repórter, é preciso saber decodificá-las, assim, de bate-pronto.

Digo isso apenas porque tenho visto e ouvido, ao longo destes poucos dias em que sou jornalista  (não chega a 10 mil dias ainda) muito repórter bom ser tachado de arrogante e não conseguir deslanchar, apenas por não entender de relações humanas. Repórter, seja de televisão ou de impresso, tem que ser poliglota em língua portuguesa. Não adianta falar inglês fluente, alemão, mandarim, enfim ser uma babel em pessoa, se o figura  vai entrevistar uma dona de casa simples, numa favela, e fala com ela da mesma forma empolada como fala com um advogado.

Veja bem, também não se trata de perguntar: “E intão, dona, quar os pobrema qui os moradô infrenta aqui?”. Não é isso, é possível falar com correção sem parecer pedante para o interlocutor. Basta entender as diferenças, e ter humildade para assumir a postura. Lembrando que, quando você ai entrevistar um personagem das classes C, D etc., só o fato de você estar bem vestido(a) (de terno e gravata por exemplo) já intimida o interlocutor. O interlocutor não vai entender que o seu terno e gravata é uniforme, é macacão de operário, né?

Essa é uma noção que se adquire com a experiência das ruas, mas se você não tiver noção, pode perder a oportunidade de adquirir esta experiência, porque o mercado é cruel. Empresa alguma vai ficar muito tempo esperando você estar pronto. Até porque, só no Paraná, as escolas estão despejando cerca de 500 novos profissionais nas ruas todos os anos.

Então, se prepare. O diplominha não significa nada lá fora e nem garante nada. Apenas (você já fez o registro? Procurou o sindicato da sua região? Não? Então corre atrás...) o habilita a conseguir um registro profissional junto ao Ministério do Trabalho. Sem registro você não pode trabalhar, por mais bonitinho que seja o retângulo pendurado na parede.

Estude comportamento humano (e não vale ir pra biblioteca, tem que ir a campo). Repórter se faz na rua. A notícia não acontece na redação. Analise as diferenças sociais, treine conversando com vizinhos, com os amigos, com a molecada do bairro (a molecada sempre tem uma linguagem diferente), visite favelas, visite prisões, visite delegacias, enfim, se enfie em tudo o que puder e que o possa ajudar a entender como falar e se comportar nas mais diversas situações, nos mais diferentes ambientes e níveis sociais.

Sabe aquelas dicas de como se vestir e se comportar quando vai procurar emprego? Tipo aquilo. Só que você não vai encontrar manual pronto, apenas dicas e caminhos e vai ter que seguir suas próprias trilhas. Uma dica é fundamental: seja humilde. Se você for humilde, e se tiver raciocínio rápido, vai conseguir se sair bem em qualquer situação. Bom, se você não tiver humildade, e nem raciocínio rápido, amigo, mude de profissão. Já temos  "goiabas" demais perambulando por aí, batendo de porta em porta atrás de um emprego.

* Escritor por devoção, poeta por impulso, jornalista por profissão. Pai da Édile e do Dilee, marido da Sueli, avô da Julia. Três ou quatro livros escritos, nenhum publicado (procura editora, séria, desesperadamente). Perfil? Bom, já  foi bóia-fria, catador de batatas, lavador de banheiros, pasteleiro, feirante, churrasqueiro de restaurante beira de estrada, pacoteiro, vendedor de tecidos, derrissador de café, repórter de impresso, pauteiro de TV, assessor de imprensa, revisor, diagramador, editor de texto de  TV, funcionário público estadual e municipal, dono de lanchonete, confeccionista, balconista, corretor de imóveis, editor-chefe de telejornal, entre outros... Atualmente vende sanduíche natural na praia de Inajá, onde mora.




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