Alguém me segue
* Por
Gustavo do Carmo
Caminho pelo centro da cidade. Alguém
me segue. Atravesso a rua. A pessoa me acompanha. Uma mulher. Loura e alta.
Seus olhos só não são apresentados porque ela usa um par de óculos escuros Ray
Ban. Paro repentinamente. Ela segue o seu caminho. Pára de me seguir.
Volto a andar. Novamente alguém me
segue. Desta vez é um senhor de cabelos grisalhos e despenteados. Barba por
fazer. Muito gordo. Usava uma camisa
branca com listras finas, que mal cabia em sua barriga gigantesca, e uma calça
jeans surrada. Aperto o meu passo. Ao contrário do que eu imaginava o homem
também acelera. Entro em uma lanchonete. O homem gordo toma o sentido oposto e
atravessa a rua, alheio ao meu medo.
Depois que eu acabo de comer um hambúrguer,
uma batata frita e um refrigerante, recomeço o meu caminho. Foi só olhar para
trás para perceber que agora sou seguido por uma senhora de cabelos tingidos de
vermelho que também estava na lanchonete e que me olha com cara de poucos
amigos. Tento disfarçar o meu temor, andando como se nada estivesse
acontecendo. Sinto tensão por estar sendo seguido. Paro em uma banca de jornal.
A senhora passa direto.
A senhora ruiva é substituída por uma
bela morena de olhos verdes e blusa decotada. Tenho vontade de perder o medo e
inverter o papel. Eu a seguindo para devorar o seu belo corpo. Por enquanto,
continua como está: ela me seguindo e eu com medo. Vejo um homem forte e de
óculos escuros que acena. Gelei. O cara parecia dizer: “Pega que é ele!”. Quase
caguei nas calças. O homem sorriu e foi ao encontro da mulher gostosa atrás de
mim. Beijaram-se apaixonados. Fui embora mais tranqüilo.
Entra em cena para me perseguir um
policial. Ele parece ser ainda mais agressivo. Dá para notar pelo seu olhar. Volto
a apressar o meu passo. Entro em uma tabacaria. Fico observando aqueles
charutos cubanos que custam, por unidade, três vezes mais que o meu salário. O
balconista me pergunta com simpatia se eu desejo alguma coisa. Digo apenas que
eu só estava paquerando os produtos. “Fique à vontade”, disse, rindo das minhas
palavras. Um velhinho franzino, cabelos e cavanhaque totalmente brancos.
Sotaque libanês. Fico na tabacaria por mais cinco minutos. Quando saio, olho
para trás e revejo o guarda, que ainda me observa. Volto para dentro da loja.
O velhinho pergunta se eu estou com
algum problema. Digo que não. Ao ver o guarda pela vitrine, parado na porta de
sua tabacaria, o libanês muda de tom e fecha a cara para mim. Não me expulsa.
Eu mesmo tomo a iniciativa de sair e também a coragem para enfrentar a minha
prisão.
O guarda grita: “Ô vagabundo!”. Paro
rendido e resignado. O policial, já empunhando o cassetete na mão esquerda, me
empurra e passa por mim. Seu alvo era um menino de rua, que rapidamente é
imobilizado e espancado pelo homem da lei.
Aliviado, volto a caminhar pelo centro
da cidade. Desta vez, sem ser seguido por ninguém. Livre para reiniciar a minha
perseguição à esposa de um milionário que me contratou e pagou uma nota para eu
descobrir se a moça está saindo com o seu motorista.
* Jornalista e publicitário de formação e
escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz
Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos”.
Bookess
- http://www.bookess.com/read/4103-indecisos-entre-outros-contos/ e
PerSe
-http://www.perse.com.br/novoprojetoperse/WF2_BookDetails.aspx?filesFolder=N1383616386310
Seu
blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante
freqüentado por leitores
Alucinações persecutórias, ou seja, paranoia. Loucuras que fazem sofrer.
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