sábado, 25 de setembro de 2010


Poesia minimalista e angustiada

* Por Luiz Carlos Monteiro


Um escritor dispõe de possibilidades de escolha diferenciadas para construir a sua obra. A luta com a palavra leva-o a buscar aquelas opções com que mais se identifica em termos de estrutura e sentido. No caso de um poeta, faz-se imprescindível o conhecimento de expressões e manifestações estéticas anteriores e atuais, pois não deve afastar-se demasiadamente da tradição ou mesmo de modalidades correntes de pós-modernidade que estão a acontecer e se perfazem ainda em nível de teoria e experimentação.

Em seu sexto e mais recente livro, Um beijo para os crocodilos, o poeta pernambucano Almir Castro Barros investe fortemente na consecução de um minimalismo obsessivo, cirúrgico e telegráfico para nortear a composição de suas formas poéticas. Utiliza-se de uma economia de meios para a gestação da palavra que a apreende em seus graus diversos de vocábulo, signo verbal, corpo de verso e estrofe. É uma tarefa que exige concisão e equilíbrio para fazer cortes, buscar o fonema exato, alcançar o verso impecável e bem realizado.

Outra tendência estética adotada, mais ligada ao discurso e ao significado, sinaliza para um lirismo algo metafísico e recortado em instâncias angustiantes da frágil condição do poeta e do homem em qualquer sociedade em que viva e transite. Tal condição lírica está intimamente ligada aos feitos da experiência cotidiana vivida ou a viver, ao sonho e ao desejo que cada poeta carrega em si, a genealogia e infância, ao ambiente familiar e à vida coletiva e social. Mostra-se reveladora também das intencionalidades do poeta no trato com a vida, a palavra e a linguagem.

Torna-se promissora aqui a atitude que renuncia a certas facilidades comprometedoras da dicção poética que se quer autêntica, viva, incidente e talvez única na sua diferenciação de base. A manutenção da fidelidade fraterna em relação aos companheiros de geração, a Geração 65, não impõe que se desvie do caminho e dos propósitos escolhidos. Assume as injunções, incertezas e consequências do próprio fazer poético, com uma poesia que amplia certa compulsão por uma escrita situada entre o rigor e o subjetivismo. E que ao mesmo tempo refreia algum excesso ou derramamento discursivo que porventura se insurja nas veredas percorridas desde o livro da estreia em 1975, Estações da viagem

Nada do que Almir escreve ocorre sem a persistência dos obstinados. Serve-se da lente dissecadora dos que não se contentam com um produto poético derivado do manuseio fácil da palavra. É um daqueles poetas que se debatem entre a esperança e a descrença, mas que podem, ao passar da borrasca, exercer a humildade e o rito de perdoar o descalabro e a insensatez alheia. Mas, ao questionar as motivações de ofensas, opressões e traições, não referenda aquela espécie de perdão sem luta, originário da passividade e do conformismo que entorpecem os sentidos e a fala. A dor e o sofrimento são minorados pela tensão saudável recriada pela poesia. O leitor é espelho e parceiro nesta travessia que envolve tanto a sua participação solidária, quanto a liberdade que sugere o preencher lacunas e incompletudes quase sempre propositais deixadas pelo poeta na busca de síntese, profundidade e aperfeiçoamento da arte de fazer e desfazer versos.

* Poeta, crítico literário e ensaísta, blog www.omundocircundande.blogspot.com

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