Ode
à voz masculina
*
Por Mara Narciso
A
voz masculina, especialmente as mais graves, causa intenso e extenso
estrago. O som reverbera nos tímpanos e é entendido no lobo
temporal, mas parece modificar hormônios que agitam as células.
Quem resiste a uma voz grossa falando, seja lá o que for? E se forem
coisas inteligentes e interessantes deixam a feliz vítima sem
defesa. Os sons de pequena frequência que os homens emanam, produzem
grande aumento na frequência cardíaca. Quem não responderia
exageradamente a esses sons? Os próprios homens? Uma voz grave não
deixa um único milímetro corporal imune/impune. É ouvir para mudar
tudo.
Muitas
vozes passaram e outras tantas ficaram eternizadas nas memórias
auditiva e afetiva. É possível alguém se apaixonar por uma voz e
dela fazer o centro de tudo. O efeito é devastador, não se desfaz,
pereniza-se. Ouvir uma voz tipo locutor de FM altera a percepção do
mundo. Nos tempos de menina havia a satisfação de ouvir Hélio
Ribeiro - registrado José Magnoli- e sua inesquecível voz na “Rádio
Bandeirantes, cada dia melhor que antes”. O radialista, morto em
2000, dizia: esse programa é ouvido pela moça do Karmann-Ghia
vermelho. Era satirizado por Chico Anysio com o personagem Roberval
Taylor (tudo eu, tudo eu), e o considerava como o melhor locutor de
rádio. Com a popularização da internet é possível entrar no
túnel do tempo, ouvindo sua locução impecável. A voz de Hélio
Ribeiro marcou muitas vidas a fogo.
A
boa voz masculina faz reféns, encanta, emociona, faz chorar e é a
melhor para locução em rádio, TV, internet e tudo o mais que
houver. Cito: Cid Moreira, Silas Esteves de Freitas, José Wilker,
Heron Domingues do Repórter Esso da Rádio Nacional e Carlos
Niemeyer do Canal 100, além de muitos outros que se enquadram neste
contexto.
O
timbre de voz tem relação com a amplitude da caixa torácica, mas
não a define, pois muitos homens pequenos e magros têm voz grave e
retumbante. Acontece uma surpresa quando se espera uma voz normal e
vem uma voz num tom agradavelmente baixo. Em alguns casos, quando
esses homens têm um talento específico, largam a locução e vão
cantar.
A
voz mais bonita do Brasil é a de Tim Maia, carioca de 28 de setembro
de 1942, e batizado Sebastião Rodrigues Maia. Nas músicas “Me dê
motivo” e “Um dia de domingo” ele explode com sua marca
registrada, tão única quanto uma impressão digital. Escutar essas
duas músicas leva a consecutivos impactos. É uma satisfação que
causa fechamento dos olhos. Que coisa! E no caso dele, à medida que
foi amadurecendo e engordando, sua voz foi ficando mais gostosa.
Recebeu uma dançante música homenagem de Jorge Benjor – W Brasil.
Tim começou a gravar em 1970, e, ao terminar, ainda tinha outro
tanto para cantar. No dia 15 de março completam 20 anos sem Tim
Maia. Morreu em Niterói em 1998, aos 55 anos, uma semana após
sofrer um edema agudo do pulmão no palco, no qual subiu sem condição
de cantar. Começou a morrer ali, tentando começar o show por duas
vezes e sair cabisbaixo, depois de inundar o mundo por 28 anos com
seu talento, intensidade, irreverência e confusões por
descumprimento de contratos. E aqui, homenageando a voz dos homens
como um todo, aproveito para aplaudir Tim Maia, sua qualidade vocal e
sua trajetória vitoriosa, alguém que viveu e cantou da maneira
hiperbólica, com muito “swing” e de uma forma jamais ouvida,
pois ninguém cantou tanto quanto Tim Maia.
*
Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia
Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de
Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”
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