De televisão e baratos afins
* Por Ruth Barros
Em todos esses anos de prática
jornalística, palpites na vida alheia, conselhos, colunas e tudo que vê e ouve,
Anabel nunca conseguiu entender o senso comum, ou melhor, nem tão comum assim
repúdio a televisão. Essa ojeriza vem principalmente dos que “se acham”, aquela
categoria “si/si”, o “tá se achando”, quem se julga mais inteligente e/ou bem
informado do que a média dos seres humanos. A auto-denominada inteligentzia
(burritzia?) brasileira trata a televisão como um bicho papão,
causadora/propagadora de todos os males, deseducadora de crianças e
adolescentes, incentivadora da falta de moral e desagregação dos costumes (até
parece) e por aí vai.
Eu, pessoalmente, acho a televisão bem
mais danosa pelo que está atrás da tela do que na frente. Creio que deseducar a
juventude é apresentar como exemplo de vida e sucesso mulheres cujo grande
mérito na vida foi ser caso de homens famosos ou eventualmente – quando uma
dessas zinhas dá muita sorte – até engravidar de um deles. Em um universo onde
educação e esforço parecem ser supérfluos, pois todo mundo quer ser modelo ou
atriz, encurtar caminho pela cama de sujeitos conhecidos é cada dia mais bem
visto e aceito. Também não gosto de programas de mundo cão, nem de gente a toa trancada em uma casa esperando por um
trocado ou para mostrar o que Deus lhe deu e o silicone turbinou em poses
ginecológicas. Mas devo confessar que acho tv uma coisa muito divertida.
É
fácil e barato ficar na tv. Tenho uma amiga que costuma decretar “dia do
pijama” com o filho pequeno, principalmente em dias muito frios. Funciona
assim: ao invés de sair pela rua afora catando cinemas ou restaurantes lotados
em fins de semana, quando ficam juntos, eles simplesmente combinam que não vão
tirar o pijama nem para tomar banho, detalhe que passa despercebido durante o
dia. Cada um fica em sua tv curtindo seus programas, dando risadas, gritando o
outro para ver as partes mais bacanas e se encontrando na hora de colocar a
comida para esquentar no micro-ondas. É uma enorme cumplicidade aquecida por
cobertores. Mas para esse esquema dar certo é fundamental existir cabo no lar.
Passar o domingo na base de Faustão e Silvio Santos, devo confessar, é dose.
Durante a semana é mais fácil. Anabel,
por exemplo, fã contumaz da Fátima Bernardes, adora o Jornal Nacional – gosto
das roupas e da graça séria dela, além de achar o jornal bem feito, jornal de
TV, que tem imagem, coisa que vários concorrentes nem tão concorrentes assim
não descobriram mesmo depois de todos esses anos. Adoro, e simplesmente adoro,
os seriados inteligentes e engraçados dos canais americanos, onde as mulheres
são reais, têm rugas, moram com amigos gays, caçam sexo pela noite adentro ou
fazem qualquer outra atividade humana que não seja acordar completamente
maquiada como nas novelas brasileiras. E os caras se sustentam como atores ou
apresentadores até a maturidade, ao contrário dos colegas VJs da MTV, que
depois que crescem vão ancorar programas duvidosos em redes de baixa audiência.
Anabel Serranegra sonha com seu próprio
programa de TV
* Maria Ruth de Moraes e Barros,
formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como
correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta
ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes
e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da
coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash,
com o pseudônimo de Anabel Serranegra.
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