O nono mandamento
* Por
Assionara Souza
— Olha, eu vou logo
dizer... É melhor eu ir logo dizendo. Pode ficar tranquila, não vou tentar
comer você. De forma alguma. É sério. Tudo o que eu fizer. Tudo o que eu
disser... Isso! Principalmente o que eu disser. O que eu pensar, não — porque,
pode ser que uma hora ou outra eu acabe pensando. Mas prometo a você; não,
melhor, eu juro a você que vou fazer um esforço. Um esforço absurdo pra não
pensar.
O importante é que
você saiba que, independentemente do que eu pensar — ah, não ia ser muito fácil
não pensar — mas independentemente disso, você pode ficar super à vontade
comigo. É. Você pode, olha só, você pode, inclusive, ser você mesma. Pode fazer
o que você quiser. Ficar relaxada. Relax, entende?! Bem tranquila. E estou
dizendo isso pois sei que não deve ser fácil mesmo. Deve ser bem difícil pra
você. É. Bem difícil.
Esses caras todos,
usando de subterfúgios baratos pra no final você descobrir que eles só estavam
a fim de uma! Uminha coisa. Única. Comigo, não. Estou aqui diante de você
dizendo a verdade. Veja, eu estou sendo sincero com você. Estou abrindo total o
jogo. É isso mesmo. Posso passar a noite inteira com você e em nenhum momento,
perceba, em nenhum momento, vou chegar em você com intenções.
Olha só, eu posso até
dançar com você. A gente pode dançar. Simplesmente dançar. Se acabar na pista.
Juro! Não vou jamais, jamais, ouviu?!, está me entendendo?, fazer um lance
diferente para forçar uma aproximação. Sabe como? Não. Inclusive eu acho isso
ridículo. Tenho pena desses babacas todos.
Fico sacando os
panacões se manguaçando de vodca e partindo pra cima das meninas com um arsenal
de baboseiras. Querendo o quê? Ah, não ria. Estou falando sério. Do que você
está rindo? Pô! Não ria assim. Comigo é diferente. Não vou dizer que eu não
penso.
Olhe pra você! Você
sabe que é um escândalo. É. Um escândalo. Deixa disso. Você sabe. Você é mesma.
Sabe que é. Todo mundo aqui sabe. Fica rindo, é? Vai rindo! Ri. Você é gostosa.
Pensar?! Porra! Só se eu estivesse morto pra não pensar. Sério! Eu penso. Claro
que eu penso. E, olha! Não é de hoje que eu penso. Aliás, é só no que eu penso.
Você quis saber. Pronto. Eu disse.
Um grande defeito meu
é a sinceridade. Sou louco por você. Essa é a pura verdade. Isso é verdadeiro
como esse gelo nessa vodca. Não. Louco, não. Sou tarado. Tarado por você. Eu
treparia com você agora. É. Fique sabendo que eu sou muito melhor do que aquele
bostinha do seu namorado. Aquele mosca. Nunca sai com você.
Aqui, ó! Na frente de
todo mundo, eu treparia com você. Se essa fosse a minha única chance. Única.
Peraí. Que foi? Ô! Escuta! Volta aqui. Não aguenta sinceridade, não é? Bebe
leite, então! Volta aqui. Pelamordideus! Ô! Mulher burra! Interpretou tudo
errado. Lá vou ter culpa de ser sincero, pô?!
* Escritora
Nenhum comentário:
Postar um comentário