Um estranho que me quer
* Por
Assionara Souza
A grana estava bem
curta aquele mês. Precisava conseguir o suficiente pelo menos para o aluguel.
Mas não pintava nenhum extra. E o dinheiro do pagamento, assim que caía,
escorria todo em contas emergenciais.
Havia já um tempo que
não comprava uma única roupa nova Sempre
aquelas de sempre. Os sapatos, pior ainda. A sola gasta não mantinha sequer a
dignidade do passo.
Não sabia mesmo lidar
com grana. Essa era a verdade. E dinheiro que vinha difícil, ia fácil. Talvez
se tentasse o contrário... Uma grana que viesse fácil, ficasse por mais tempo.
Mas isso era impossível.
Grana fácil só para
quem já nascia com grana. Isso deixava ela puta. Meio do mês e aquela aflição
de pobre estourando no meio do peito. Insônia e taquicardia. Tinha que dar um
jeito.
Pensou isso
esfaqueando muitas vezes o suco de maracujá com o canudinho. Até que seus olhos
flagraram o carinha de terno que não tirava os olhos de cima dela.
Essa agora! Pescou uma
nota de cinco solta dentro da bolsa e acertou o lanche. Na saída da lanchonete,
uma chuva torrencial disparou no meio da tarde e ela sem guarda-chuva. Má
sorte, tempo ruim.
O carinha de terno se
aproximou dela e sacou num golpe de herói um enorme guarda-chuva daqueles
pretos que os ambulantes vendem por uma merreca em dias assim. Nem se ela
quisesse podia comprar um daqueles agora. Sorriu sem graça esfregando as gotas
grossas que já molhavam todo o seu braço.
“Está indo pra que
lado?”, perguntou o rapaz. “Pra os lados da minha casa”, ela respondeu sem
perceber que não fazia muito sentido o que disse. “É pra lá que eu vou”, o moço
devolveu com certo humor o que ela dissera.
Aquele terno não devia
ser barato. Num instante passou pela cabeça dela uma possibilidade de arrumar a
grana pro aluguel. Por que não? Uma grana fácil. E para o que estava disposta
não precisaria de roupa nova. Aliás, não precisaria de roupa alguma. Topou na
hora.
* Escritora
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