Retrato do cotidiano
* Por Roberto Corrêa
Viver o cotidiano
somente é simples para as crianças e os jovens. Os jovens encaram a vida com
mais naturalidade, não se preocupam com problemas físicos ou metafísicos e com
isso vivem o momento que passa. As crianças, na maravilhosa candura e
inocência, no desprendimento total, na absoluta confiança nos pais são ainda mais felizes do que os jovens. Os
adultos, porém, coitadinhos, enfrentam a dura realidade. Á medida que os anos
passam, as ilusões vão desaparecendo, a realidade vai se tornando crua demais e
o cotidiano, infelizmente, não
representa mais dourados momentos, uma felicidade sonhada e desejada. Ainda
mais nos tempos atuais de curtição das más notícias, das mortes e dos
assassinatos fantásticos e inesperados, terrorismo, atentados, sequestros e
toda a gama de ações humanas perversas e chocantes.
Para libertar o nosso
cotidiano dessa carga nociva de
pessimismo atemorizante, não é fácil. O
trabalho representa o pensamento positivo e cheio de frutos contra os males do
cotidiano. Acontece, porém, que o homem, criatura remida, mas sempre pecadora,
se excede em tudo. Com muita dificuldade consegue trabalhar dentro da
normalidade. Ora se excede, trabalhando exageradamente, ora se omite deixando
de trabalhar. A sociedade que deveria facilitar tudo, promover a perfeita
acomodação dos indivíduos que dela fazem parte, geralmente se omite e o que
acontece são esses problemas todos que temos pela frente e não sabemos como
resolver. Há uma grande parte da população desempregada, procurando meios para
sobreviver e há outra porção trabalhando exageradamente, perdendo a saúde e a
alegria, geralmente em benefício dos magnatas, dos donos do poder, do dinheiro
e da terra.
Deus, porém, se
encontra ausente. Ninguém comenta a sua presença, as razões de viver, o destino
que nos espera, o curto tempo da existência humana e tampouco se interessa pela
solidariedade e fraternidade. Assim, todos procuram acomodar as suas vidas e
dificilmente se interessam em colaborar com o próximo. Essa colaboração, porém,
poderia vir da própria sociedade, ao menos facilitando a vida dos cidadãos,
diminuindo os entraves burocráticos inúteis, uma vez que na prática, a vantagem
dos agrupamentos humanos tem se restringido, sobretudo, aos serviços de água,
de energia elétrica ou não, de
comunicações telefônicas. O cotidiano vazio, monótono ou atarefado é uma tristeza, principalmente
se a esperança - que deve sempre animar o homem-, estiver ausente. Felizmente,
não senti nenhum atrativo em relembrar o cotidiano do idoso, dos enfermos, dos
hospitalizados dos sofredores em geral, a partir dos pobres de baixa renda, aos
encarcerados em lúgubres presídios etc.,
evitando reflexões tão pesadas e doridas. Quanto ao cotidiano dos
magnatas do poder e daqueles imersos nos prazeres que a vida material pode
oferecer somente os vinculados ao mundo de Belial o poderão fazer com maestria.
Roberto
Corrêa é sócio do Instituto dos Advogados de São Paulo, da Academia Campineira
de Letras e Artes, do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico, de
Campinas, e de clubes cívicos e culturais, também de Campinas. Formou-se pela
Faculdade Paulista de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Fez pós-graduação em Direito Civil pela USP e se aposentou como Procurador do
Estado. É autor de alguns livros, entre eles "Caminhos da Paz",
"Direito Poético", "Vencendo Obstáculos", "Subjugar a
Violência”, Breve Catálogo de Cultura e Curiosidades, O Homem Só.
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