Julian
Assange, meu filho, nosso filho, meu amor!
* Por
Urda Alice Klueger
Ele poderia ter sido
meu filho. Em 1971, quando ele nasceu, eu tinha 19 anos, começara a trabalhar
num primeiro emprego e estava a me apaixonar irremediavelmente por aquele que seria
o tão grande amor da minha vida que nunca acabaria de passar.
Tudo era apropriado
para eu ter tido um filho nessa altura: era jovem, saudável, tinha células
perfeitas para dar continuidade à vida, um companheiro perfeito para dar origem
a um filho perfeito – só que Julian Assange não nasceu de mim, embora hoje,
olhando para trás, bem queria que tivesse sido eu a lhe dar à luz.
Ele não nasceria no
Brasil, no entanto, e o nome da sua mãe seria Christine, ao invés de Urda. Como
se fosse também um pouco meu filho, nasceria por cá pelo mesmo Hemisfério Sul,
embora a Austrália, o país dele, até hoje ainda me faça pensar, em primeiro
lugar, em cangurus, coalas e no grande crocodilo que quase comeu a perna do
Crocodilo Dundee, além de uma fila de governantes que nunca me parecem
simpáticos, todos usando uniformes certinhos, de terno, gravata e barrigão, os
quais passaram a me chamar a atenção a partir das atrocidades acontecidas em
Timor Leste. Eta gente fria, aquela dos governos australianos!
E o menino genial não
nasceu de mim nem do Brasil, mas nasceu tão genial que pôs todo o mundo em
polvorosa. Tenho prestado atenção nele desde o primeiro dia em que Willian
Bonner, aquele mesmo que disse que seleciona as notícias para o ignorante
público brasileiro ver no Jornal Nacional pensando se agradariam ou não a Homer
Simpson falou a respeito do sítio daquele menino genial errando na pronúncia,
dizendo que era o “uaikeliks”, para no dia seguinte se retratar e dizer
“uikeliks”, tão grande era o impacto da notícia no mundo.
O fato é que um menino
que era puro gênio nascera no mundo, brincara um pouco de hacker para aprender
a como fazer para descobrir os grandes segredos que se escondiam nos novos
aparelhos das novas tecnologias, e ontem à noite, ainda, ouvi como ele contou
como estava tentando entender o mundo que o rodeava e onde vivia – e da sua
estupefação ao entender, ainda tão menino, que o que pensara bonito como uma
ave canora não passava da mais sórdida cova de leões que já se viu sobre este
planeta, com seus milhões de malefícios, assassinatos , guerras sujas, economia
podre e a vileza das mais diversificadas traições.
Quando entendeu o que
verdadeiramente passava, sua genialidade diante da tecnologia moderna fê-lo
criar a mais sofisticada das páginas da Internet, onde sua sede de justiça e
ânsia da verdade passou a publicar as mais ignóbeis verdades sobre o que
acontece, de verdade, no mundo, deixando de calças curtas os maiores assassinos
da humanidade a babujar desculpas esfarrapadas nas quais ninguém mais acredita
e a alertar ao povo inocente sobre verdades que a gente simples nem imaginava.
É claro que aquela
máfia do horror, aquela que ficou de calças curtas, tratou logo de botar a mão
nele e na sua equipe: encurralaram-no em Londres com um bobo pedido de extradição
para uma Suécia grande alimentadora de guerras com a venda das armas que produz
– e estava implícito que da Suécia haveria uma nova extradição para um outro
país chamado Estados Unidos onde a mais amenas das esperanças era a de uma
cadeira elétrica.
Não compreenderam
Assange, claro! O lindo menino que poderia ter sido meu filho enganou um pouco
de cá, um pouco de lá – e acabou por ir proteger-se dentro da embaixada do
Equador, aquele país de gente tão querida que já pude conhecer um dia.
Claro que o Equador
lhe deu asilo político – e claro que os parentes dos crocodilos da Austrália
não estão nem aí para o filho de quem deveriam se orgulhar. O problema, agora,
é tirar Julian Assange de dentro da embaixada do Equador, levá-lo até ao
aeroporto de Londres para que ele possa, afinal, lépido e faceiro, tomar o rumo
desta nossa América dita Latina que comunga dos seus ideais e já o ama por
antecipação.
Por enquanto a coisa
ainda não se deu, pois está cheinho de polícia inglês ao redor da embaixada
equatoriana, esperando o menor pretexto para ir lá acorrentar esse menino como
se fazia no tempo da Idade Média!
Tenho fé na minha
América, no entanto! De um jeito ou de outro, Julian Assange vai acabar sendo
trazido para cá e vai ser o nosso orgulho. Pudesse eu, ia lá contrabandeá-lo
para as delícias de Quito.
Julian Assange, meu
querido, quisera ter sido a tua mãe, e então te chamaria de Julian Assange, meu
amor! Tua mãe foi outra, o que não quer dizer que não possa te chamar de meu
amor! Venha logo, nuestra América está te esperando!
(Para Eduardo Venera
dos Santos Filho)
Blumenau, 2 de
setembro de 2012
*
Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR,
autora de mais três dezenas de livros, entre os quais os romances “Verde Vale”
(dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12 edições).
Cada um de nós tem suas virtudes e pecados. Gosto de conhecer o que acredita e o que desacredita, os que são seus heróis e os seus bandidos. Os seus argumentos são tão convincentes Urda. É porque usa a estratégia do amor para seduzir seus leitores e faz isso com uma maestria, que encanta.
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