A Sinfonia não terminou
* Por Urda
Alice Klueger
Choveu, hoje; era necessário. Neste tempo de fim de Primavera e de quase
Natal tudo tinha que estar perfeito, e a chuva deveria lustrar e fazer luzir
cada folhinha desta Mãe-Terra do Vale do Itajaí, porque era o dia em que ela
deveria abrir o seu ventre para receber para o descanso de para-sempre aquele
seu filho dileto chamado Hélio Hahnemann.
Só soube que Hélio partira faz pouco, e mal queria crer. Liguei, então, para
Noemi e Roi Kellermann, e eles estavam acabando de chegar da despedida daquele
Ser-Beija-Flor que se cansara de bater suas asas coloridas e resolvera que era
tempo de ir dormir seu sono mais reparador no ventre da terra deste Vale. Dói
saber, dói muito, assim como dói a cada vez que a gente perde as pessoas que
ama, e então saí para caminhar um pouco pela tarde, para, mais perto da
Natureza, tentar entender por que Hélio se fora, os porquês das partidas, e
Hélio tinha sido sempre tão especial, puro talento transformado em cores e
pleno daquele sentimento que eu acho que a gente deve chamar de “saudade do que
ainda não aconteceu”, e foi ele, exatamente ele, o Grande Retratista a transpor
para as telas as mais diversas facetas deste Vale do Itajaí. Uma vez ou outra,
ia ele espiar a desembocadura do Vale no mar, e também essas espiadas ele pintou,
e se o Vale do Itajaí tem hoje uma maravilhosa iconografia, não há como duvidar
a quem a deve: ao Beija-Flor irriquieto, pleno de luminosidade interior, que
soube captar todas as nuances das cores, das formas e da poesia, e que hoje ...
nos deixou.
Eu penso em Hélio como a gente pensa numa Sinfonia, e era assim que ele era
mesmo, pois sinfonias me fazem ver cores e sensações que talvez não visse ou
sentisse se elas não existissem, e Hélio era assim, fazia com que a gente
quisesse ver o que não deixava claro – havia quadros dele que eu ficava com
vontade de espiar pelo lado de trás, para ver como é que era o pátio traseiro
daquela casa, ou o outro lado daquele ribeirão, quem sabe a parte interna de um
esquecido estábulo do meio de um pasto...
Então saí a andar pela tarde para tentar entender os porquês dolorosos das
partidas, e a Natureza de fim de Primavera estava toda absolutamente tão linda
assim depois da chuva, que então eu entendi: toda ela se preparara para receber
no seu ventre aquele que lhe fora tão fiel ao longo de toda a vida, e não era
como se uma Sinfonia tivesse terminado – Hélio Hahnemann estará sempre como uma
colorida música bailando de beleza dentro deste meu Vale do Itajaí!
*
Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR,
autora de mais três dezenas de livros, entre os quais os romances “Verde Vale”
(dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12 edições).
Passou a fazer parte do Vale que ele tanto amava e recriava. Descanse em paz!
ResponderExcluir