Formalidade do ensinar
* Por Pedro J. Bondaczuk
O ato de ensinar, seja lá o que
for, para outras pessoas, requer uma série de virtudes de quem se propõe a
assumir essa missão. Entre estas, destacam-se a paciência, a perseverança, o
otimismo, o bom-senso e amor, muito amor pelo que se faz. Há, porém, quem
consiga ensinar sem contar com nenhuma dessas características? Há, embora essa
ausência comprometa a eficácia.
Todavia, há uma formalidade sem a
qual ninguém consegue transmitir nada (nem informações, nem conhecimentos, nem
conceitos, nem experiências etc.) para ninguém. Para ensinar os outros é
preciso, antes de tudo, “saber”. “Óbvio!”, dirão alguns, sem sequer refletir ou
pestanejar. A questão deveria ser encarada, de fato, com essa obviedade. Mas
não é.
Há muita gente por aí tentando
ensinar os outros sem que sequer saiba plenamente a respeito do que se propõe a
transmitir. Há muitos professores despreparados, sem ter cursado, sequer, os
quatro primeiros anos do Ensino Básico, lecionando, por este Brasil afora, para
suprir a ausência de mestres qualificados.
Convenhamos, a remuneração paga a
quem assume essa missão fundamental em qualquer sociedade é um escândalo. Não
motiva ninguém a seguir a carreira do Magistério e nem a se preparar
adequadamente para essa função, quando já está em seu exercício. Interesses
outros,. de políticos despreparados, que não um ensino de qualidade,
notadamente nas escolas públicas, destinadas à população de baixa renda,
prevalecem e redundam na “deformação”, em vez da formação, de parte
considerável das futuras gerações.
Infelizmente, há muita gente
tentando ensinar o que não sabe, ou que sabe apenas superficialmente (o que, às
vezes, é pior do que não saber por completo) num arremedo de educação. Tais
professores “fingem” que ensinam e seus alunos, em contrapartida, “fingem” que
aprendem. Trata-se de um processo em que todos perdem, principalmente o País.
Faço estas observações com a
experiência de quem já se propôs a ensinar (e, de fato, ensinou) a uma centena
de jovens, a princípio não muito interessados em aprender. Esta época de
aprendizado (pelo menos do básico) coincide com a fase mais difícil da vida de
qualquer pessoa: a da rebeldia (geralmente sem causa) e da auto-suficiência,
ditadas, exclusivamente, pela falta de maturidade.
Os alunos (salvo exceções) são
adolescentes, em várias fases da adolescência, que atravessam um período de
transformações físicas e não entendem sequer o que se passa em seus próprios
corpos, quanto mais no mundo. É aí que o mestre tem que se mostrar melhor
preparado, para ensinar não somente os itens do currículo da matéria que
leciona, mas as regras básicas do comportamento, que irão prevalecer na
seqüência da vida de seus pupilos.
Tem que estar preparado para
responder a todas as perguntas, referentes ou não ao objeto de estudo. Nos
tempos de faculdade, para poder custear meu curso, restou-me, apenas, como
opção, colher as migalhas pagas pelas instituições de ensino aos seus mestres.
Sem querer me engrandecer e nem exaltar meus supostos méritos, porém, posso
afirmar que jamais fui confrontado por alguma pergunta que não soubesse
responder.
Foi o período mais trabalhoso da
minha vida. Além de ter que estudar as matérias do curso que fazia na
faculdade, tinha que fazer isso em dobro na preparação das aulas que teria que
ministrar. Foi, porém, a época em que mais aprendi. Jamais cheguei diante da
classe sem saber a fundo o que pretendia transmitir.
O desafio maior que enfrentei foi
o de conquistar a confiança dos meus pupilos. Foi o de mostrar, antes e acima
de tudo, a relevância da matéria que estava lecionando para as suas vidas.
Parece fácil, não é verdade? Tentem, porém, por um único dia que seja, para
descobrirem o tamanho do desafio que isso implica.
Até hoje ainda não sei se tinha
(ou se tenho) vocação para o Magistério. Contudo, minha classe foi, de toda a
escola, a de menor índice de reprovação. E isso ocorreu não porque eu
eventualmente fizesse vistas grossas aos supostamente parcos conhecimentos dos
meus alunos. Pelo contrário, eu era tido e havido como o professor mais
rigoroso e parcimonioso na atribuição de notas de toda a escola.
O que consegui foi a empatia dos
adolescentes. Foi prender sua atenção, não com gritos, expulsões de classe,
ameaças ou demorados e cansativos sermões, como os professores fazem, via de
regra, para impor e manter a disciplina. Isso foi possível graças, unicamente,
à credibilidade que conquistei.
E como logrei essa façanha? Da
única forma que jovens na tenra idade se convencem: mostrando-lhes que “sabia”
o que me propunha a ensinar. Esse é, pois, o caminho (creio que único) para
assegurar a qualidade de ensino, que ainda deixa tanto a desejar em nosso País.
* Jornalista, radialista e
escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes
Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular
onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio
Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia”
(ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal”
(contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com.
Twitter:@bondaczuk
Boa ideia, essa da credibilidade. Mas como consegui-la num primeiro momento? As questões têm por objetivo derrubar o professor, e minar a confiança dele em sim mesmo e dos alunos de toda a sala.
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