Marmichef
* Por
Marcelo Sguassábia
Fazer
alta culinária na baixa gastronomia. E teria outra saída? Com o
preço estratosférico das trufas negras de Périgord e o poder
aquisitivo do brasileiro mais ralo que caldinho de feijão em Belford
Roxo, a alternativa mostrou-se tão revolucionária quanto salvadora.
O que acabou inspirando pratos como Dobradin (leia-se “Dobrrrradan”),
Beef au Rolex, Moela au vin e Gateau Miaux – o manjado
churrasquinho de gato mal passado. Todos com a inconfundível marca
da nouvelle cuisine, a partir de uma formidável e inusitada
harmonização de carnes pré-podres de abatedouros clandestinos.
Estroigros,
o mito, emprestou generosamente seu talento, sempre remunerado a peso
de ouro, em troca de um salário de zinco. Resolveu encarar a
empreitada como um esforço de guerra e um desafio descomunal à sua
notória habilidade com as caçarolas.
O
custo final agradou em cheio o populacho. Como na culinária francesa
a quantidade de comida é inversamente proporcional à complexidade
do prato, as quentinhas eram do tamanho de uma forma de empada,
permitindo jogar o preço lá embaixo. O grande problema é que um
estivador do porto sai para o almoço verde de fome, disposto a
engolir talheres, guardanapo, mesa e cadeira junto com a comida. E
quando lhe entregavam o marmitex de grife que mais parecia uma
latinha de Pastilhas Valda, irava-se com o motoqueiro e recusava-se a
passar o seu cartão Sodex na maquininha, dizendo-se lesado e
prometendo relatar o imbroglio todo no “Reclame Aqui”.
Para
cada marmitex entregue, correspondiam quatro ou cinco posts
destruidores nas redes sociais. A estratégia, a princípio tão
original e promissora, ia de mal a muitíssimo pior.
E
assim a coisa foi degringolando. Para entregar comida em quantidade
industrial, o “grude” teria que ser de péssima qualidade – o
que faria de Estroigros um ingrediente dispensável, mandando “a la
merde” o único diferencial do negócio. Se continuasse primando
pela excelência, seria forçado a abandonar o segmento de quentinhas
e voltar ao velho QG, na esperança da crise ir embora e o cliente
voltar. Estroigros não sabe o que fazer. E faltam dez para o meio
dia.
*
Marcelo
Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Hora do rango! O que tem para hoje? RO: Resto de Ontem.
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