Fotos:
Manoel Freitas
Setembro
é o nono mês do calendário
* Por
Mara Narciso
Quando
apaixonados somos infantis. Quando irados somos animais selvagens.
Mas quando entra setembro tornamo-nos esperançosos, pela proximidade
da estação das flores, sendo obrigatório ouvir
Sol de Primavera, de Beto Guedes. Em caso contrário, setembro não
chegou.
A
psicóloga carioca Silvia Costa, amiga virtual do Facebook postou a
seguinte frase, que ela disse desconhecer a autoria: “É setembro,
que delícia! Já podemos começar nosso processo de
auto-primaverização”. Estamos em franca campanha do setembro
amarelo, de combate ao suicídio. Bem escolhida a cor amarela, pois
no norte de Minas, neste mês o tempo é dessa cor, como para tornar
aconchegante a época de plantar e colher.
Em
setembro a nossa expectativa de chuva chega ao nível máximo. As
árvores mudam de roupa, mesmo antes de vir a chuva do broto, no
começo da primavera. Há sete anos sem chuvas normais, andamos com
nosso reservatório de água em níveis de reserva, com racionamento
de água desde outubro de 2015. Há bairros que já ficaram até
cinco dias sem receber uma só gota. Alguns tentam estocar água,
outros têm cisterna ou poço artesiano, mas o lençol freático dá
sinais de exaustão.
Falam
que o rodízio setorial da cidade é de 24 horas com água para 30
horas sem água, mas há algum tempo a escassez parece ser bem maior.
Quando a água chega à rede, vem fraca e quase não sobe, e se sobe
as poucas horas não enchem a caixa. A maior preocupação é não
ter água, mas principalmente, abrir pouco para logo fechar a
torneira.
Durante
o banho, mesmo no inverno rigoroso deste ano, com um mês inteiro com
temperaturas de 12º C nas madrugadas, era para tomar banho rápido,
ensaboando com o chuveiro desligado. Não tem graça alguma passar
xampu e não ter como enxaguá-lo. Montes Claros é cidade quente, e,
as pessoas têm o hábito de tomar dois banhos diários. Mas como? Há
um medidor de gasolina, como também da carga no celular, mas de água
na caixa, aqui embaixo não tem.
O
normal (existe normalidade de clima nesses tempos pós-destruição
do cerrado?), era chover de outubro a março, com período de
“inverno” em dezembro, com chuva todos os dias e o “veranico”
em janeiro (sem chuva por pelo menos 20 dias). Os nossos rios hoje
sem água (passando carro em seus leitos) eram caudalosos. Saudades
da visão da água, pois está quase tudo seco há anos. O Rio São
Francisco cheio é uma imagem do passado.
Nos
seis meses de chuvas, tem chovido apenas uma semana, com temporais,
que derrubam muros, levam carros, matam gente e acabou. Agora só no
próximo período de chuvas. Será que vem? Disseram que quando faz
frio, o período chuvoso é bom. Crendice? Esperança exacerbada?
Cada um acredita no que quer.
Vimos
os caminhões de carvão levar o cerrado durante décadas. Passavam
centenas deles na BR 135 em direção a Sete Lagoas. Fariam o ferro
guza para a indústria automobilística. Simultaneamente plantaram
imensas florestas de eucalipto na região. Nessas áreas gigantescas
quase não se vê animais. Eram para prover de celulose as fábricas
de papel. A indústria da destruição dizimou o cerrado, arrancou os
pés de pequi, murici, panã, mangaba, cagaita e outros pela raiz,
com correntes amarradas em tratores. No lugar foi deixando os
eucaliptos. Alguns pontos só têm erosões nuas estorricadas, pois
com o “progresso” a chuva não mais voltou.
Comunidades
inteiras estão sedentas, plantadas num deserto. Não foram feitos os
investimentos necessários, mas o preço da água vai subir quase
11%. Agora, só em Montes Claros 400 mil pessoas estão com sede. As
autoridades garantem que é preciso acalmar a população. Desesperar
jamais! Mas como? Ainda bem que temos setembro!
*
Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia
Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de
Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”
Puxa vida... Montes Claros não merece nem essa escassez de água nem os tremores de terra, não tão raros por aí, né? Que setembro chegue trazendo boas novas pra todos vocês, Mara.
ResponderExcluirNosso consolo é que as avarias nas casas são de pequena monta. Agradeço a força, Marcelo. E que a chuva volte.
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