Vem pra briga você também. Vem!
* Por
Marcelo Sguassábia
- "Omo faz, Omo
mostra". Mas mostra o quê? Acho vago esse raciocínio.
- Queria que eu
fizesse um tratado filosófico? Slogan bom tem no máximo seis palavras. Eu me
virei com quatro. Tinha feito outras opções para apresentar, na verdade gostava
mais de um outro. Mas o cliente escolheu esse.
- Não foi o meu caso.
Quando criei "Danoninho vale por um bifinho", só mandei um e acertei
logo de prima. Na convenção da empresa me fizeram uma homenagem, como autor de
um posicionamento que iria diferenciar o produto nos próximos 20 anos. Foi
muita responsabilidade. Pra você ter uma ideia, me deram de presente um
Chevette GP Okm, daquele laranja com friso preto.
- Vai me desculpar,
mas com esse slogan você convence a mãe, não a criança. Tá falando que é
nutritivo, mas o pirralho não está nem aí com isso.
- Não, não. Eu falo
pra criança que, comendo um Danoninho, ela escapa do chato do bife.
- Tá bom, mas deixa eu
defender minha cria e explicar o meu "Omo faz...
- Se precisa explicar
é porque não deu o recado. E depois, já faz uma cara que isso saiu do ar, pra
que ficar ressuscitando defunto?
- Bom, o mesmo vale
pro seu "Danoninho", meu velho. Aliás, estamos os dois com as
chuteiras penduradas há bom tempo, não sei que diferença faz essa discussão.
- Pra mim é questão de
honra. Olha só, o "bifinho" rima com "Danoninho", o jingle
do comercial de TV utilizava "O bife", que qualquer criança sabia
tocar no piano. Todo mundo entendia que aquilo não era guloseima, era alimento.
E era gostoso! Pra ficar veiculando tanto tempo, a campanha tinha que ser muito
boa, tinha que ter um conceito convincente.
- E tinha. Mas
"Omo faz, Omo mostra" também durou um tempão. Eram comerciais
testemunhais, tinha que ter veracidade. O slogan fazia uma releitura do
"mata a cobra e mostra o pau". A dona de casa se convencia, tinha
medo de arriscar com outra marca e deixar a roupa encardida. Acho que só a
gente sabia da verdade. O pessoal de desenvolvimento de produto dava a entender
que sabão em pó era commodity, tudo igual. Essa constatação acabou entrando até
no briefing da campanha. Hoje eu fico imaginando, se eu tivesse gravado aquela
reunião com o cliente, quando ficou quase explícito que sabão em pó era tudo a
mesma coisa, eu mesmo - como criador - poderia ter processado a empresa por
propaganda enganosa.
- Mas aí você poderia
ser processado também. Como cúmplice!
- Você fica aí
falando, falando, mas na época dessa sua campanha do bifinho, muita gente
questionou a propaganda, dizendo que o valor nutricional não era equivalente.
Além de ter muito açúcar, corantes, conservantes...
- Se todo mundo fosse
ficar olhando o rótulo de tudo, ninguém comeria nada. E a gente perderia o
emprego. Como diria o ministro da Fazenda, dos bons tempos do comercial do
bifinho: "o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde".
- Tem cara de slogan
isso, heim. Outro seu?
- Não lembro, pode
ser. Com Rexona, sempre cabe mais um.
Esta é uma peça de
ficção. Qualquer semelhança com o mundo maravilhoso da propaganda terá sido
mera coincidência. Promoção válida só até sábado, ou enquanto durar o estoque.
* Marcelo Sguassábia é redator
publicitário. Blogs: WWW.consoantesreticentes.blogspot.com
(Crônicas e Contos) e WWW.letraeme.blogspot.com
(portfólio).
Os slogans duravam anos e todos os sabiam de cor. O tempo passou e com eles as frases marcantes. Os equívocos da indústria alimentícia se tornaram comuns,sem contar os erros grosseiros contra a saúde e a proibição de propaganda de alimentos que engordam, especialmente dirigidos ao público infantil. Tudo mudou e hoje não é possível nada parecido.
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