A ética de Ali Babá
* Por
Frei Betto
O Brasil assiste,
estarrecido, a uma aula magna de sem-vergonhice, descaramento e falta de ética.
A lição descabida de corporativismo é digna dos quarenta ladrões de Ali Babá.
Em matéria de política, a criminalidade resulta da soma de imunidade com
impunidade.
A CPI da Petrobras
gasta fortunas do contribuinte e termina com um relatório pífio, no qual o
único culpado é quem, por meio de delação premiada, colabora com a Justiça na
identificação de criminosos. Pretender impor uma lei que proíba a delação
premiada é o mesmo que convocar a nação à omissão geral frente ao crime.
Se você souber que
alguém rouba os cofres públicos, sonega tributos, compra parlamentares, faça
vista grossa, fique calado, associe-se ao criminoso pela via da omissão
cúmplice.
Boa lição para as
nossas crianças e jovens! Só falta suprimir das delegacias o Boletim de
Ocorrência. Ao ser assaltado ou furtado, cale-se, jamais delate o crime e o
bandido.
Há décadas se fala em
ética na ou da política e pouco se avança. Nem as provas inquestionáveis do
crime são suficientes para ao menos envergonhar parlamentares que, como o rei
da parábola, estão nus mas insistem que todos admirem seus lindos trajes.
Uns, porque sonham com
o golpe paraguaio de decretar o impeachment de Dilma. Outros, porque Ali Babá sabe
distribuir benesses aos 40 ladrões e agora os mantém com o rabo preso. Se o
traírem, haverão de pagar com a secura das fontes escusas de abastecimento de
campanhas eleitorais.
Por que a nação não se
mobiliza pela ética? Porque, estamos, como diria Guimarães Rosa, na terceira
margem do rio. Saímos do longo período em que a ética era pautada por valores
religiosos, consciência de pecado, culpa diante de Deus. Quantos jovens estão,
hoje, preocupados com pecado?
E ainda não atingimos
a margem socrática da ética fundada na razão, alicerçada em princípios
kantianos e assegurada por instituições que sejam mais fortes que as virtudes
humanas.
Assim, o limbo ético
abre espaço à política do toma lá, dá cá; do corporativismo que coa mosquitos
ao se tratar do adversário, e engole camelos quando se trata de defender sua
"tchurma"; da omissão e do silêncio que buscam encobrir a mentira, a
malversação, o nepotismo e a corrupção. Na casa da mãe Joana, o debate
"ético" consiste em medir se o meu corrupto amealhou mais que o
seu...
Haja Jesus batizando
empresas de fachadas! Usa-se e abusa-se do Santo Nome em vão, já que isso ilude
os incautos e amealha votos para a seara dos lobos em pele de cordeiros.
Se o Brasil não reagir
a tanto descaramento e cinismo, faltarão bananas para espelhar o baixo nível de
nossa republiqueta.
* Frei Betto é escritor, autor de “O
que a vida me ensinou” (Saraiva), entre outros livros.
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