domingo, 10 de junho de 2012

Inteireza das metades

* Por Lêda Selma

“... E que a minha loucura seja perdoada, porque metade de mim é amor, e a outra metade também.” – Oswaldo Montenegro


Tenho duas metades conflitantes:
uma é inquietaude,
a outra, solidão.

Uma é desassossego,
a outra, calmaria.

Tenho duas metades contrastantes:
a que sossega dores,
a que instila lembranças.

Uma conduz-me a delírios,
a outra, a saudades.

Tenho duas metades piedosas:
uma é ataúde,
a outra, liberdade.

Uma é espólio de medos,
a outra, covil de desejos.

Tenho duas metades intrigantes:
uma é reduto de gritos,
a outra, motim de prazeres.

Uma é ida sem caminho,
a outra, volta com atalho.

Tenho duas metades poderosas:
uma reza feito santa,
a outra, serpente, profana.

Uma é casta, quase insana,
a outra, fugaz e devassa.

Tenho duas metades tortas:
uma enlouquece e amedronta,
a outra persegue e abate.

Uma é fantasma,
a outra, impiedade.

Tenho duas metades implacáveis:
uma é morte,
a outra, tempo.

Uma satiriza verdades,
a outra martiriza sonhos.

Tenho duas metades sutis:
uma é rastos de lua,
a outra, restos de chuva.

Uma diz o que sinto,
a outra, o que minto.

Tenho duas metades perigosas:
uma recende amor,
a outra provoca a vida.

• Poetisa e cronista, licenciada em Letras Vernáculas, imortal da Academia Goiana de Letras, baiana de Urandi, autora de “Das sendas travessia”, “Erro Médico”, “A dor da gente”, “Pois é filho”, “Fuligens do sonho”, “Migrações das Horas”, “Nem te conto”, “À deriva” e “Hum sei não!”, entre outros.

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