* Por Anamaria Kováks
O velho Imperador chinês descansava no seu pavilhão predileto. Era outono, e as folhas das árvores caíam em incessante chuva dourada. Sob o sol pálido, ele contemplava o seu país, as montanhas, os campos, os rios e as cidades que mandara construir.
De repente, seus olhos, cansados de tanta luz, abaixaram-se e vieram pousar em suas mãos. Foi como se as visse pela primeira vez. Quanta coisa realizara com elas! Erguera palácios, diques e aquedutos; desviara o curso de rios, construíra muralhas e pontes; assinara tratados de paz e declarações de guerra; condenara homens à morte, sentenciara outros à prisão e a alguns poucos concedera a anistia...
Como estavam velhas aquelas mãos! Pareciam as folhas do outono, encarquilhadas, amarelecidas e manchadas. As veias, saltadas, grossas, emaranhavam-se sob o pergaminho da pele, e os ossos das falanges destacavam-se nitidamente, prenunciando o esqueleto.
O Imperador estremeceu, enquanto um vento gelado lhe descia pelas costas. Passeou os olhos em redor, tentando pensar em outra coisa, mas as folhas douradas a dançar no espaço lembraram-lhe novamente a passagem do tempo.
Que mais fizera com estas mãos? Afagara crianças, acariciara mulheres... pintara quadros, escrevera poemas... Voltou a olhá-las, pensativo. Por fim, apanhou a campainha de prata ao lado da cadeira e agitou-a. Um servo apareceu.
-Chama o meu alfaiate.
-Sim, Majestade.
O servo curvou-se e sumiu. Pouco depois, o velho alfaiate agachou-se diante dele.
-Mandou chamar-me, Majestade... aqui estou.
O Imperador encarou-o com o cenho franzido.
-Deixa ver tuas mãos.
Trêmulo, o alfaiate aproximou-se e exibiu-as. Como as do Imperador, pareciam folhas enrugadas e manchadas. O Imperador disse então:
-Vou lançar um novo estilo para as túnicas dos mandarins.
O alfaiate, surpreso, murmurou:
-Sim, Majestade.
-De agora em diante, o Imperador e sua corte usarão túnicas de longas mangas, que irão até a ponta dos dedos.
-Perdão, Majestade... Isso quer dizer que as mangas cobrirão as mãos?
-Isso mesmo.
-Assim será, Majestade - murmurou o alfaiate, e retirou-se.
O Imperador, satisfeito, recostou-se em sua cadeira e voltou-se novamente para a bela paisagem outonal. Não precisaria mais pensar em suas mãos...
• Escritora, jornalista e professora universitária
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