sábado, 2 de junho de 2012

Finesses na nuestra América que sequer imaginamos

* Por Urda Alice Klueger

(Excertos do livro “Viagem ao Umbigo do Mundo”, publicado em 2006)

E naquela noite houve o solene encerramento do Encontro Intercontinental, com um jantar num lugar extremamente bonito, uma antiga capela barroca que virara restaurante. Era a capela de um antigo monastério, e o restaurante levava esse nome. Enquanto escrevo estas linhas eu olho para algumas fotos dessa capela, e ainda me parece incrível que tenha estado lá. Não sei o que acontecera para a Igreja ter-se desfeito daquele recinto do mais puro, fino e elegante barroco – mas o fato é que se desfizera. Quem transformara a capela num restaurante tinha a medida da finesse e da beleza do lugar, e o restaurante ali instalado também tinha a finesse e a beleza que seriam necessárias para que não se perdesse no mínimo a solenidade e o respeito que aquele lugar merecia. Penso que, dificilmente, no mundo, poder-se-á ir-se a um restaurante tão perfeitamente belo e encantador quanto aquele, um testemunho do mais elegante barroco que se criou nas Américas, com suas pinturas originais e suas paredes folheadas a ouro.

Foi nesse ambiente de extremo luxo e bom gosto que cada delegação e cada amigo foi homenageado, e se distribuíram os diplomas e outros troféus aos PHD que tinham vindo dos mais diversos pontos da América para aquela confraternização. Houve diversos discursos, de agradecimento e já de saudade. Era o final.

Saí de lá com o meu diploma de APHD[1] e com um gosto de despedida na boca. No dia seguinte as delegações ou os companheiros começariam a partir para os seus países. Da nossa turma, quem partiu primeiro foram o Zé Barbosa e o Azor. Não sei se voltaram a Iquique, se deram satisfação ao alcaide seu amigo por não estarem lhe levando a periodista prometida, conforme tinham combinado na ida. Eu veria o Zé Barbosa mais uma vez, em Blumenau, no ano seguinte, mas jamais imaginaria que, enquanto termino este livro, ele de repente desdobraria suas escondidas asas de Anjão Barroco Desajeitado, fugido de uma igreja setecentista, e voaria embora para sempre.[2] Eu não tinha idéia de que gostara tanto dele até saber da sua inacreditável partida – passei bem mal um dia inteiro, como a gente fica quando perde um amigo do peito – tínhamos, mesmo, virado uma família.

[1] APHD – Amiga dos Proprietários de Harley Davidson
[2] Zé Barbosa sofreu um acidente numa curva, no Paraguai, em 07 de março de 2006, onde faleceu. (Nota da autora)

* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR

Um comentário:

  1. Ah, esses amigos e esses umbigos. Ficamos gostando deles e dos lugares onde estivemos juntos, e tristes quando os perdemos.

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