sexta-feira, 13 de abril de 2012



Páscoa antiga

* Por Anamaria Kovács

Há muitos e muitos anos, na distante metrópole do Rio de Janeiro, uma garotinha de cinco anos esperava ansiosamente a visita de um coelho. Não era um coelho qualquer, mas um coelhinho especial, diferente. Misterioso... Como condição para sua visita, era necessário, em primeiro lugar, que a garota se comportasse muito bem, obedecesse aos pais e à avó, semanas antes do dia marcado, um domingo. E não era só isso: com a ajuda de sua mãe, ela precisava confeccionar um ninho, que podia ser uma caixa de papelão, forrada com palha, ou, na falta desta, com papel picado.

O “cestinho” deveria ficar oculto num canto da casa ou do pequeno jardim, na véspera da visita. Importante, também, era que o visitante permanecesse invisível, ou seja, não era permitido à menina encontrar-se com ele, sob pena de não receber os ovos de chocolate que ele distribuía.

A expectativa era enorme. No sábado de Aleluia, a garota custava a pegar no sono, imaginando por onde estaria pulando o tal coelho, e por que ele punha ovos, e ainda por cima de chocolate, se não era galinha. De manhã bem cedo, ela já estava de pé, e chegava a vislumbrar um par de orelhas brancas aqui e ali, atrás dos canteiros do jardim. Finalmente, depois de vestida e lavada, ela podia iniciar a caça aos ovinhos. Surpresa! Não só o cestinho improvisado estava repleto deles; na “pressa” de distribuí-los, o generoso coelhinho perdera uma porção de ovos pela casa, e era preciso encontrá-los todos.

A menina cresceu, amadureceu, e lamenta, hoje, a perda dessa fantasia pelas novas gerações. O coelho seguiu o triste destino do Papai Noel e virou garoto-propaganda. Os cestinhos vêm prontos, decorados e caros, assim como outros enfeites inventados para engordar os lucros dos comerciantes; os ovos de chocolate, caríssimos, estão pendurados em lojas e supermercados desde a quarta-feira de Cinzas (outro feriado religioso desaparecido, engolido pelo Carnaval esticado até o final da semana).

Perdeu-se, assim, o prazer de procurá-los pela casa – e os pais perderam uma ótima oportunidade de controlar o comportamento da criançada. Isso sem falar que o significado religioso da festa e do período que a antecede é simplesmente ignorado pela grande maioria dos cristãos. Aliás, descubro agora que, devido ao alto preço dos ovos de chocolate, muitos consumidores estão preferindo comprar barras do doce. Lá se vai o significado simbólico dos ovos... Não me admiraria se, daqui a algumas décadas, ao serem perguntadas sobre Jesus Cristo, pessoas batizadas em seu nome perguntassem: “Quem?”

• Escritora, jornalista e professora universitária

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