Educadores potenciais
* Pedro J. Bondaczuk
O
educador tem tarefa das mais importantes, que não se limita a uma
única pessoa, único grupo, ou única geração, mas que se estende
por todos outros. Compete-lhe transmitir experiências, princípios,
virtudes, comportamentos, descobertas e valores que se perpetuem e
tornem as pessoas melhores, mais seguras, abnegadas, justas e
solidárias. Sua missão não se restringe à simples transmissão de
conhecimentos. Não se deve, pois, confundir o educador com o
professor. O último pode exercer a tarefa do primeiro, não,
contudo, com exclusividade. Há diferenças profundas entre educar e
meramente instruir. E não se trata, só, de mero preciosismo
semântico.
O
educador caracteriza-se pelo desenvolvimento e consolidação de
saudáveis e construtivos comportamentos – individuais e coletivos
– nos educandos. Pais, mestres, sacerdotes, líderes comunitários,
jornalistas, escritores etc. são, todos. educadores em potencial. E
nem é preciso que o sujeito seja letrado para tal. Pode ser
analfabeto, não distinguir o “o” do “u”, mas se contar com
princípios de boa conduta e higiene e cultivar valores testados pelo
tempo, exercerá essa missão com a mesma competência (ou, quem
sabe, maior) do que a de um doutor, com dezenas de títulos
acadêmicos.
Os
educadores são os verdadeiros construtores do futuro quando exercem
com consciência e assiduidade essa missão educativa. Quem exerce
esse papel é o sublime semeador de esperanças, que lança,
cotidianamente, sementes e mais sementes, no solo (nem sempre fértil)
das mentes e dos corações dos futuros líderes. Carrol Lewis
afirmou a respeito: “A tarefa do educador moderno não é derrubar
florestas, mas irrigar desertos”. Ou seja, é transformar
mentalidades estéreis e esturricadas em férteis e produtivos
campos, em que brotem saudáveis florestas de solidariedade e de
amor.
“Não
cabe ao professor a tarefa de educar?”, perguntará, perplexo e um
tanto confuso, o curioso leitor, convicto de que estou equivocado a
esse propósito. Não estou. Pode, de fato, caber-lhe “também”
essa missão, mas não se trata de sua função específica, e muito
menos exclusiva, como o vulgo supõe. Afinal, o que vem a ser, de
fato, um “professor”? Por definição, é o que “professa”
alguma idéia, conceito, filosofia ou ideologia. Para melhor
entendimento, é preciso recorrer ao dicionário. Escolhi o Michaelis
de língua portuguesa (como poderia ter escolhido o Aurélio que
daria na mesma), para esclarecer a questão.
O
verbo professar, de onde deriva a palavra “professor” (o que
professa), tem dez significados. Vamos a eles?
-
Reconhecer ou confessar publicamente. Exemplo: professar uma doutrina ou uma opinião (Provou com obras a amizade que me professava).
-
Ensinar como professor. Exemplo: professar matemática.
-
Ter a convicção de. Exemplo: professar ideias fraternistas.
-
Fazer propaganda de; preconizar. Exemplo: Professar a verdade e advogar o bem.
-
Pôr em prática. Exemplo: Ele professa as idéias que prega.
-
Exercer uma profissão; dedicar-se a uma arte. Exemplo: Professar a medicina.
-
Abraçar ou declarar-se devoto ou adepto (de uma doutrina, uma religião, uma seita, um partido). Exemplo: Professa publicamente o cristianismo.
-
Proferir votos, ligando-se a uma doutrina, a uma ordem religiosa, a uma religião. Exemplo: Professara no catolicismo. (“Não professaste, és livre, podes dar-lhe a mão” – Rebelo da Silva).
-
Prometer, jurar. Exemplo: Professar amizade a alguém.
-
Ter, manter (afeição, amizade). Exemplo: Salomão, com quem professas amizade (Mário Barreto).
Viram?
Professor é o que faz tudo isso e não apenas, ou especificamente, o
que ensina, instrui e eventualmente educa. Já o educador pode (e
deve) ser você, ser eu, ser o padre da sua paróquia, o pastor da
sua igreja, o escritor que lida com conceitos etc. etc.etc. Sua
ferramenta é a persuasão, a capacidade de convencimento e, não
raro, o exemplo. Afinal, nada do que se impõe pela força prospera,
dura e produz bons efeitos de longo prazo. Em princípio pode, até,
parecer que é eficaz. Não passa, todavia, de ilusão.
Educar,
pois, não é impor, como até recentemente se pensava (muitos ainda
pensam), mas é, sobretudo, convencer, conquistar corações e mentes
e persuadir. O educador que não tem isso como norma não está
preparado para essa magna tarefa. Tem que ser educado antes de pensar
e de se propor a educar. Frank Clark constatou: “Pode-se levar uma
eternidade para conquistar o espírito do homem pela persuasão, mas
ainda assim é mais rápido do que conquistá-lo pela força”. Eu
acrescentaria que não só é o meio mais rápido, como o único
verdadeiramente eficaz. Se quem educa não tem argumentos para
persuadir o educando da correção do que quer transmitir, é porque
não tem convicção a respeito. Em vez de educar, reitero, precisa
ser educado.
É
verdade que é virtualmente impossível exercermos qualquer
influência benéfica no comportamento social do mundo todo, por mais
sábios e famosos que sejamos, dada sua vastidão confrontada com
nossa pequenez, fragilidade, e efemeridade. Mas isso não é pretexto
para a omissão. Se não podemos mudar comportamentos viciosos e
daninhos da nossa cidade, Estado, país ou de um continente, podemos
(e devemos) fazê-lo ao nosso redor: na nossa casa, nossa rua, nosso
quarteirão ou nosso bairro.
Isso
requer, antes e acima de tudo, sinceridade e dedicação da nossa
parte. E, principalmente, ação. Ou seja, atitudes e exemplos.
Simples palavras, desacompanhadas de atos, em nada resultam. O
pensador japonês Daisaku Ikeda constata a propósito: “Quando uma
pessoa é sincera na consideração pelos outros, mesmo nos assuntos
mais banais, então poderá provocar uma modificação completa no
mundo que a cerca”. Isto é, salvo raríssimas exceções, o máximo
que podemos fazer. Façamos isso, no entanto, com constância,
diligência e competência. E, sobretudo, com sinceridade. Não
abramos mão do nosso potencial de educadores!
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de
Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do
Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções,
foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no
Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios
políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas),
“Antologia” – maio de 1991 a maio de 1996. Publicações da
Academia Campinense de Letras nº 49 (edição comemorativa do 40º
aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53,
página 54. Blog “O Escrevinhador” –
http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
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