Imposto
celestial
* Por
Marcelo Sguassábia
Aconteceu
ontem, às 15h39 pelo horário de Brasília. E eu, como funcionário
de carreira da Polícia de Fronteira da Nação Tupiniquim – PFNT –
jamais publicaria esse relato se ele não espelhasse rigorosamente a
verdade.
Por
uma manobra involuntária e desastrada do controle em terra, um dos
nossos drones de vigilância atravessou uma espessa camada de nuvens
e adentrou os domínios de uma colônia de desencarnados. Uma das
hélices do aparelho rasgou a túnica de um anjo e depenou sua asa
direita, o que provocou um alvoroço como não se via desde os tempos
de Zebedeu. Milhares de outros anjos de diferentes escalões do
paraíso foram cercando o drone, pálidos de espanto com a
geringonça, como se presenciassem uma aparição de Nossa Senhora de
Fátima. Foi daí que tivemos uma vaga ideia da imensa “extensão
territorial” do pós-morte, ainda sem legislação que a
regulamente e faça dela uma fonte de recursos para a União, os
Estados e os municípios.
Assim,
sugiro a criação, em regime de urgência urgentíssima, do ICEL –
Imposto Celestial. Uma vez comprovada a vida após a emissão da
Certidão de Óbito, como bem demonstrou o episódio do drone, o
cidadão retoma automaticamente seus deveres de contribuinte, pagando
pelo uso do espaço aéreo que lhe couber nos planos superiores.
Não
é porque morreu que se adquire o direito de não contribuir mais.
Assim é fácil, certo? Basta o indivíduo se matar para não pagar
mais imposto. Uma covardia com o erário público, quase um crime de
omissão aos deveres cívicos e tributários.
Se
a moda pega, estamos falidos. A esfera pública e o mundo corporativo
também. Outro dia mesmo saiu uma notícia dizendo que, em 2098, o
número de perfis de mortos no Facebook será maior do que o de
vivos. E aí, como fica? Será que a maior rede social do planeta
deixará de existir por causa disso? Os mortos serão maioria, e o
espertíssimo Mister Zucker irá rebolar mas encontrará um jeito de
fazer dinheiro com o pessoal que não posta mais nada.
Mas,
voltando à ideia do novo imposto, há um único problema a ser
contornado para regulamentar sua cobrança. Como ainda não há meios
de instituirmos uma moeda oficial do Céu, por meio da qual o
desencarnado recolheria o que deve aos cofres da nação, os
herdeiros do mesmo ficariam responsáveis pelo pagamento, em terra e
em reais, do ICEL em nome do finado – cobrando dele depois, se for
o caso, da forma como julgarem mais conveniente.
*
Marcelo
Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Os pagamentos dos impostos voltarão no tempo até os ancestrais macacos. Com tanto dinheiro, não acontecerá uma hiperinflação?
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