Consolação
ou humor?
A imaginação, se ou quando
bem-utilizada, nos é altamente benigna. Serve-nos de consolo por aquilo que não
conseguimos (e que não podemos) ser, permitindo-nos apelar para outras
características ao nosso alcance, que compensem nossas fraquezas e contradições
e nos valorizem. Ademais, nos possibilita que venhamos a desenvolver senso de
humor. Que, em vez de nos afligirmos com nossas trapalhadas e deficiências,
possamos rir delas, sem qualquer complexo ou constrangimento.
Apenas pessoas que confiam no que são
(e no que podem fazer) e, sobretudo, imaginativas, sabem rir dos próprios
defeitos e tropeços. Em contrapartida, as que buscam dissimular suas evidentes
falhas, dando a entender que se tratam de virtudes, caem no ridículo, sem que
sequer se apercebam. São destituídas de imaginação, ou não a usam de forma
adequada e, por isso, sofrem em dobro: pelo que não são e pelo que são.
Pessoas desse tipo parecem sofrer de
perpétua “auto-idolatria” (e classifico isso, sem pestanejar, assim mesmo, de
sofrimento). São indivíduos que se apaixonam pela própria imagem e acabam se
afogando no regato do ridículo. Adoram o próprio umbigo e sentem-se (ou pelo
menos agem) como se fossem o centro do universo. Evidentemente, não são! Esse
tipo de postura é caminho mais do que certo para acumular decepções, mágoas,
rancores e profundíssimas frustrações.
Indivíduos que agem dessa forma – e não
necessariamente os paranóicos megalomaníacos – acabam garantindo, mais cedo ou
mais tarde, a clientela dos psiquiatras (e isso quando se dão conta da sua
distorção comportamental e tentam corrigi-la), quando não se tornam presas
fáceis de charlatães, que lhes subtraem, sempre que podem, até o derradeiro
centavo. Bem feito!
E tudo por que? Porque são despidos de
imaginação. Porque não sabem rir das próprias deficiências e colocá-las no
devido lugar. Por não se darem conta de que os que zombam deles são tão
imperfeitos e contraditórios (quando não muito mais) do que eles.
Quem, alguma vez na vida, não desejou
ser um craque de futebol famoso, ou um mega-star de música pop, ou um ator
consagrado que impressione todas as mulheres (e durma com muitas delas)
etc.etc.etc.? Quando crianças, ao nos perguntarem o que desejamos ser quando
crescermos, via de regra citamos quatro ou cinco atividades que, no íntimo,
sabemos que nos são interditas, como astronauta, piloto de Fórmula 1,
centro-avante da Seleção Brasileira de Futebol e assim por diante. E quantos
conseguem essa façanha? Pouquíssimos, não é verdade?
Por outro lado, quantas pessoas se
sentem efetivamente satisfeitas com o que de fato são? Embora não pareça, são
poucas, muito poucas, diria que em quantidade irrisória. Algumas fazem dessa
insatisfação – que na medida certa é saudável – mola propulsora para grandes realizações.
Outras... sentem-se inúteis, derrotadas, inferiores, imprestáveis e caem em depressão. Valorizam-se
em demasia e quando descobrem que não são o que pensavam que fossem, se sentem
perdidas. Carecem de imaginação. Não podem, não querem e não sabem relevar os
próprios defeitos e muito menos rir deles.
Os que têm essa faculdade, ou seja, os
que não se levam tão a sério assim, não raro até ganham uma profissão que os
pode consagrar. Tendem a tornar-se humoristas, por que não? Afinal, as cenas
mais engraçadas e hilariantes são as que refletem deficiências, trapalhadas,
tolices etc., nossas e dos outros. Ninguém ri de virtudes, da competência e do
talento. Estas características, no entanto, infelizmente são raras, daí terem
tamanho valor.
Quando criança, eu quis ser, quando
crescesse, pela ordem: cientista, escritor, peão de rodeio, centro-avante,
médico, músico e pintor. E tudo ao mesmo tempo. A fértil imaginação fez com
que, pelo menos na minha mente, eu fosse, de alguma maneira, tudo isso simultaneamente.
Se eu disser que não me frustrei com o
fato de não ter conseguido atingir a maioria desses objetivos, estarei
mentindo. Como gostaria de ter vocação para a música! Não tenho. Como eu queria
ser um artista plástico, um Rembrandt, um Rubens, um Monet ou um Rafael! Nunca
passei, todavia, sequer próximo a isso.
Mas de sete desejos, concretizei, ao
menos, um. Nada mau, não é verdade, se levar em conta que a maioria das pessoas
não concretiza nenhum?. Sou escritor. Se bom ou ruim, não me compete julgar.
Claro que conheço minhas deficiências e, estejam certos, me divirto com elas.
Rio das minhas distrações. Comento, sem
nenhum escrúpulo, minhas trapalhadas, as infinitas mancadas que dou
praticamente todos os dias e as perpetuo em textos. E apesar dos meus
(felizmente poucos) inimigos me acusarem de narcisismo intelectual, não me
considero belo, nem sábio e nem charmoso. Talvez me ache (embora não tenha
certeza) um tantinho competente no que faço. Se não for, também, não irei
considerar essa inabilidade nenhuma tragédia. Afinal, tenho imaginação, que me
consola e faz com que ache graça naquilo que desespera tanta gente.
Boa leitura!
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Belo, se não se julga assim agora, pelo menos já foi. Vi fotos. O humor é a crítica mordaz das imperfeições, burrices e outras fraquezas. Tudo politicamente incorreto faz rir.Você está certo. Errado está em achar que quem enche os consultórios psiquiátricos tenha culpa das suas fraquezas. As doenças mentais graves são determinadas geneticamente e não há escolha a não ser penar do sofrimento mental que as crises trazem. Mas você geralmente acerta. Não ligue para os inimigos. Você não precisa convencer ninguém, e mesmo assim convence.
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