Quando o verde dos teus olhos
* Por
José Geraldo Neres
A estiagem
prolongou-se levando o brinquedo preferido. O Mandacaru alimenta e fere os
olhos verdes da inocente infância. Lágrimas secas rolam de semblantes amarelos.
A esperança é uma nuvem d’água, mas essa migrou para um povoado distante.
O alazão voador está
aprisionado no solo ressequido, seu olhar pede um pouco de carinho - não
consigo mais sonhar.
Meus amigos brincam de
esconde-esconde, uns na jardineira engolidora de pais e, enquanto aos outros, a
fome fechou os olhos.
Zezinho e Antônio são
companheiros de caminhada para a escola – e esta é nossa única sombra de um
futuro melhor.
Na volta da aula uma
momentânea alegria me acalma. Perco-me propositadamente de meus colegas e sigo
Ana: flor que nunca vi, a estranha e mais bela nestes sertões. Seu perfume é só
meu. Para minha sorte, eles a ignoram.
Nossa caminhada é
prazerosa, embora o tempo imponha seu curso impiedosamente: sol, mugido de gado
extinto.
Ana me carrega e seu
sorriso brilha como uma manhã nunca vista. Promete desvendar-me seu segredo, assim
que chegarmos em sua morada. O caminho parece diferente, as aventuras ficaram
para trás.
Debaixo de uma grande
árvore, com galhos de folhas mortas, ela revela de forma enigmática:
– Voltarás a sonhar. O
teu caminho será verde. O céu te dará asas. Amanhã não voltarei.
Naquele dia de
setembro, como em muitos outros dias do ano, Zezinho e Antônio foram à minha
casa. A notícia dada por minha mãe não os assustou, fazia parte do cotidiano da
região:
– Ele só esperou a
primavera, parece estar sonhando.
O silêncio apoderou-se
de meus amigos e assim se retiraram de casa.
De volta à
peregrinação, Antônio acrescentou:
– Aquela flor que ele
segurava, eu nunca vi aqui no sertão.
* Poeta
e curador da Quinta Poética de São Paulo, blog “Outros Silêncios” - HTTP://neres-outrossilencios.blogspot.com
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