Humildade lúcida
Confundimos, via de regra, conceitos
simples e tornamos complexo aquilo que de fato não é. Duas virtudes
indispensáveis na vida, geralmente mal-entendidas, são, vira e mexe,
desvirtuadas e ganham conotação de defeitos: humildade e coragem.
Há quem entenda (erroneamente, claro)
que ser humilde é se apequenar diante do próximo, o considerando superior em
todos os aspectos. Engano. É, isto sim, ter consciência da própria força e das
potencialidades, mas também das limitações. É saber que, por maiores que sejam
os nossos recursos, talentos e habilidades, são insuficientes para as
necessidades da vida. É, antes de tudo, contar com o indispensável senso de
proporção e com a benfazeja autocrítica..
Já a coragem não é, como alguns pensam,
se atirar de cabeça contra quaisquer perigos, sem sequer atentar para as
conseqüências. Isso é temeridade, senão irresponsabilidade e tendência suicida.
Ser corajoso não é isso. É, isso sim, fazer, com determinação, cautela e
método, o que tem que ser feito, sem bravatas ou ostentações.
O saudoso escritor e psicanalista
Roberto Freire (não confundir com seu homônimo político) escreveu o seguinte, a
propósito, em sua coluna “Cidade Aflita”, publicada no jornal Última Hora em 17
de dezembro de 1964, sob o título “Mano aí, sim”: “Viver integralmente o nosso
mundo, sem preconceito algum, aceitando suas contradições como forças naturais
e sociais em choque, à procura de uma síntese evolutiva, eis a posição do homem
de humildade lúcida e de coragem despretensiosa. Não se trata de uma posição passiva,
absolutamente. Condenar apenas esta ou aquela atitude, aplaudir outras, vivendo
cômoda e covardemente à margem da realidade atual, boa ou má, esta sim, seria a
passividade condenável”.
O perdão, por sua vez, é uma das
atitudes mais nobres e superiores que podemos ter face aos semelhantes. É,
simultaneamente, humildade e coragem e, sobretudo, ato de sabedoria, posto que,
como seres imperfeitos e falíveis que somos, freqüentemente, precisamos ser
perdoados pelos agravos (reais e/ou imaginários) que causamos ao próximo. E se
não soubermos perdoar quem nos ofenda, não há como pretender que sejamos
perdoados quando ofendermos alguém.
Não por acaso, o Mestre dos Mestres,
Jesus Cristo, fez desse ato sublime e nobre um dos pontos centrais dos Seus
ensinamentos. Parece que não aprendemos nada a respeito. Não raro, nos
recusamos a perdoar, até (ou principalmente) as pessoas que dizemos amar,
mostrando, na prática, que nosso tão apregoado amor não passa de falsidade.
Existe alguma regra infalível, alguma
norma de conduta eficaz para orientar uma conversação útil e proveitosa? Há
algum dicionário específico que contenha as palavras adequadas a serem usadas
nessas ocasiões? Não, não existe. Mas há uma atitude que podemos e devemos
adotar como regra: sensatez.
A pessoa sensata não sai por aí
falando, a torto e a direito, mal da vida alheia. Não inventa rótulos para
aplicar aos desafetos e nem perde tempo com conversas vãs, que somente quebram
o silêncio (que é tão precioso nesta época de tanto barulho) por absolutamente
nada.
A conversação sadia versa sobre idéias,
opiniões e conceitos a respeito de valores, de forma equilibrada e respeitosa,
sem que ninguém tente impor, a ferro e fogo, seus próprios conceitos aos
interlocutores. Consiste em diálogo, nunca em maçantes monólogos.
Entre as muitas palavras ambiguas,
geralmente consideradas sinônimas sem
que o sejam, duas se destacam: orgulho e vaidade, ambas antônimas (cada
qual à sua maneira) da humildade. A primeira, traz em si, embutida, uma
opinião. Já a segunda, reflete, antes de tudo, um desejo secreto (raramente
admitido pelo vaidoso).
Conheço pessoas orgulhosas, de nariz
empinado, que se acham o supra-sumo da perfeição, mas que não têm um pingo de
vaidade. Não se importam nem um pouco com a aparência, com a ostentação e nem
com o que os outros pensam delas. Suas opiniões sobre elas mesmas lhes bastam.
Também são muitos os vaidosos que não
nutrem qualquer orgulho. Querem ser admirados, mas no fundo da alma acham que
não são tão bons como gostariam de ser. A escritora inglesa, Jane Austen,
esclarece, a respeito: “O orgulho relaciona-se mais com a opinião que temos de
nós mesmos, e a vaidade, com o que desejaríamos que os outros pensassem de
nós”.
Melhor, claro, é deixarmos de lado
qualquer laivo de pretensão e nos revestirmos da humildade lúcida e da coragem despretensiosa.
Agindo dessa maneira, certamente jamais precisaremos pedir perdão a quem quer
que seja por eventuais agravos. Mas, se ainda assim alguém se julgar ofendido
por nossas palavras ou pela nossa postura, não devemos hesitar um só momento.
Pertinente ou não a queixa alheia, jamais tenhamos a vergonha, ou a vaidade, ou
o orgulho de pedir perdão. Isso sim é viver com coragem. É ter essa humildade
lúcida de que tanto falei.
Boa leitura!
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Ficou bem claro. Essa explicação já esteve aqui há pouco tempo, noutro texto.
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