sexta-feira, 17 de maio de 2013


B de bunda

* Por Rodrigo Ramazzini

Sala de aula. Prova de química. No “fundão”, sentados lado a lado, Mateus e Eduardo iniciam um diálogo no tom mais baixo possível para não chamar a atenção da professora.
- Meu...
- Hum.
- Mateus...
- Fala. Tô ouvindo...
- Sabe a quatro?
- Qual? Não escutei. Fala mais alto.
- A questão quatro. Sabe a resposta?
- Não fiz essa ainda.
- E a doze?
- Também, não!
- E a treze?
- A.
- A?
- Isso.
- Tem certeza?
- Acho que sim. Eu marquei essa.
- Acha ou tem certeza.
- Tenho certeza.
- Eu achava que era b.
- Marca a que tu quisé.
- Vou de A. Vou confiar em ti.
- Eu não estudei muito. Já aviso...
- Eu não estudei nada! Há! Há! Há!
- Psiu! Fica quieto, mané! A professora vai ver...
- Vai nada. Essa aí não vê nada. Olha a grossura das lentes dos óculos dela. Parece um fundo de garrafa! Há! Há! Há!
- Há! Há! Há!
- Posso saber o que está tão engraçado aí no fundo?
- Nada professora!
- Nada mesmo, professora!
- Fiquem quietos, senão vou tirar a prova de vocês!

Dez minutos depois.

- Mateus...
- Hum.
- Sabe a vinte? Falta só essa pra mim.
- Qual? Não entendi.
- A vinte. Sabe?
- Não entendi. Fala mais alto...
- A vinte...
- Qual?
- A vinte, meu!
- A vinte é...
- O que é isso, Eduardo e Mateus?
- O que, professora?
- Quié, professora?
- Vocês acham que eu sou boba, é? Que eu não ouvi vocês conversando! Tentando colar, hein? Me deem essa prova!
- Tá louca, professora?
- É... Professora...
- O que é então, Mateus? Explica...
- O Eduardo enchendo o saco... Tirando sarro da minha cara dizendo que já estava na questão vinte... Que eu sou burro e não terminei ainda!
- E?
- E eu o mandei tomar na bbbbuuuunda!
- O que é isso, Mateus?
- Só estou contando o que aconteceu, ora...
- Tu já terminaste a tua prova?
- Não! Quase...
- E tu, Eduardo?
- Já, professora! Toma... E tu, Mateus, estou te esperando lá fora para a gente acertar as contas... Ninguém me manda tomar na bunda e fica assim!

Silêncio na sala de aula. Furioso, Eduardo deixa o local reclamando e gesticulando com os braços. Parte da turma fica chocada com a sua reação. O restante dos alunos eufóricos pela possibilidade de briga entre os até então amigos. Com a atitude de Eduardo, a professora até esqueceu que fora tirar a prova dos dois estudantes que estavam colando. Oito minutos depois do ocorrido, Mateus termina a prova e deixa a sala, reencontrando Eduardo no pátio da escola. Uma “plateia” assiste ansiosamente a cena esperando o desfecho do episódio turbulento iniciado durante a prova. Mateus e Eduardo param-se frente a frente um do outro. São cercados pelos outros alunos. Olham-se seriamente. Breve silêncio e então...   

- Há! Há! Há! Dá um abraço aqui, Mateus!
- Há! Há! Há! Tu entendeu, né?
- Há! Há! Há! Claro, Mateus! Captei vossa mensagem amado mestre, quem nem diria aquele personagem da escolinha do professor Raimundo. Era “B” de bunda a resposta da vinte, né?
- Era! Garoto esperto é outra coisa, hein?
- Há! Há! Há!
- E a professora, Eduardo? Nem se ligou!
- Pois é...
- Também! Com aquele teu teatro... Convencia qualquer um. Já pode virar ator! Há! Há! Há!
- Há! Há! Há! Vou pensar no assunto...

* Jornalista e contista gaúcho

2 comentários:

  1. Eu passaria batido nessa. Não captei nada. Acho que é porque nunca colei na vida.

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  2. Pô, Mara! "Quem não cola, não sai da escola". Como te formaste? Há! Há! Há! Brincadeira! Obrigado pela leitura e comentário!

    Tenha um ótimo final de semana!

    Aquele abraço!

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