* Por Fernando Yanmar Narciso
Para que alguém se sinta superior, muitos outros devem sentir-se inferiores. Eis a filosofia por trás de qualquer competição esportiva, do arremesso de martelo à corrida anual de velotrol no condado de Baked Potatoes, Arizona (condado fictício, a propósito). Quase todo grande esportista tem o bullying correndo nas veias, pois mesmo que não demonstrem abertamente, o objetivo deles é trolar os outros competidores através de suas habilidades esportivas.
Por mais que o único esporte que importa para os brasileiros seja o futebol, afinal somos pentacampeões mundiais, nada é capaz de limpar de nossa garganta o amargoso de ser o eterno rabo entre as pernas da pira olímpica. Desde que os jogos foram oficializados no fim do século XIX, há sempre três países que monopolizam a caixa registradora de medalhas, e a quantidade de medalhas conquistadas invariavelmente mostra qual será o país a ditar as regras do jogo na geopolítica mundial pelos próximos quatro anos.
Vejam as olimpíadas este ano. A China e os Estados Unidos, até o último sábado, estavam em empate técnico no número de medalhas, a Grã- Bretanha, anfitriã dos jogos, vem em 3º lugar, e o Brasil... Vem com o aspirador de pó, para limpar a poeira no pódio. Nossos “atletas” até o momento só ostentaram oito medalhinhas. OITO! E isso que são esportistas experientes, com tempo de estrada considerável. Como nossos vizinhos poderiam nos respeitar com essa mixaria? Com certa razão, parece ter se tornado moda nesses jogos sermos vaiados pelos britânicos. Um país onde a educação física não é mais obrigatória nas escolas não merece ser medalhista.
Não se enganem. Olimpíadas nada têm a ver com o enaltecimento do espírito esportivo e da capacidade humana de ultrapassar os próprios limites. Há muitos anos, diria que desde os tempos de Hitler, elas servem ao único propósito de mostrar o poder de uma nação ao resto do mundo. Os atletas estão lá meramente como outdoors de uma ideologia política e como garotos-propaganda de grandes marcas.
Sempre rolam as desculpinhas esfarrapadas, os bons e velhos ossos de consolação para tentar minimizar o sofrimento dos torcedores. “Ah, o que importa não é a quantidade, é a qualidade!” Desculpa de quem já se acomodou ao maldito complexo de vira-lata. Está incutida na genética latinoamericana a mania de querer ver lado bom em qualquer tragédia. Amamos lamentar as pitangas e tentar fazer o resto do planeta sentir pena de nosso biquinho. Mas biquinho também não ganha medalha! “Ah, mas isso já é mais que esperado! A gente é sempre azarão, com o tempo você se acostuma.” Acostumar? Os terroristas presos em Guantanamo tiveram de se acostumar com as torturas dos soldados. Masoquismo também não devia constar em nossa agenda! “Ah, mas a gente vai descontar na copa de 2014, o caneco já é nosso!” Certo, mas 2014 é 2014, o que importa é o agora! E ainda vêm Rio 2016, onde passaremos vexame mais uma vez, só que em solo pátrio.
Reza a lenda que quando Charles Miller voltou ao Brasil, trouxe de presente uma bola de futebol e uma de rúgbi, para que escolhêssemos qual seria o esporte-símbolo da nação. Provavelmente, ao ver o imenso livro de regras e condutas do rúgbi, que mais parece uma Bíblia do Vaticano, com várias páginas para se ler ANTES de chegar às regras do jogo propriamente ditas, preferimos adotar o futebol, que quase não tem regras, baseia-se profundamente na improvisação e qualquer Zé ou João já pode sair jogando. Desde aquele tempo a incultura já era incentivada por nossos governantes. A falta de costume com a leitura, com o aprendizado de regras, tornou-se um importante traço de nossa personalidade, treinamo-nos a aprender a jogar instintivamente. Assim que esse quadro se inverter, talvez tenhamos alguma chance de impor respeito noutros esportes, com ou sem bola. Mas até lá, continuaremos a lustrar nossas singelas oito medalhinhas. Voltar pra casa com um pedacinho de metal no pescoço continua sendo melhor que voltar sem nada... NOT!
*Designer e escritor. Site: HTTP://terradeexcluidos.blogspot.com.br
Gostei das argumentações do já colocado articulista jovem, de ideias firmes e crítica ácida. Faz bem em não se conformar com pouco. Ótimo texto!
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