Sempre
e nunca são tempos longos demais!
* Por
Mara Narciso
Por hábito, há pelo
menos 16 anos, escrevo com frequência e periodicidade. Com o tempo fui
reparando que, depois de pronto, o texto aceita a supressão de muitos
vocábulos. Inclusive meu primo Cláudio Narciso, que também é jornalista, fala
que escrever bem é saber cortar palavras. Logo vi que “sempre” e “nunca” não
fazem falta nenhuma. Passem a reparar.
Se não mudam o sentido
por escrito, na vida mudam tudo. Sempre ou nunca, qual delas traz maior
desconforto? Há a máxima “na Medicina, nem sempre, nem nunca”, e depois de mais
de 37 anos de exercício pude confirmar isso muitas vezes. São tantos os
resultados inexplicáveis, que o melhor é não tentar elucidar. Diante de uma
hipótese diagnóstica, trabalha-se com informações variáveis e flexíveis por si
mesmas. Utiliza-se a história da doença, o exame físico e os exames
complementares para se tomar uma decisão. Algumas vezes se faz necessário o uso
da prova terapêutica, cuja tentativa e resultado podem ser os únicos caminhos.
A Medicina baseada em evidências é uma larga estrada e a experiência do médico
marca pontos.
Erros médicos podem
ocorrer por imperícia (não sabe o que está fazendo), negligência (não faz o que
deveria ser feito), e imprudência (é precipitado e faz o que não deveria). O
corpo humano é plástico e pode consertar pequenos desacertos. O organismo se
ajusta, “apesar do médico”, dizem os próprios médicos. O que nunca pode falhar
é a relação médico-paciente, em que devem pesar empatia, confiança e respeito.
Algumas situações
médicas aproximam-se do quase nunca e do quase sempre. Tanto uma quanto a outra
expressão podem significar coisa boa ou ruim. Se há iminência de coisa ruim, o
médico poderá tranquilizar dizendo (desde que seja informação verdadeira), que
aquilo quase nunca acontece. Por outro lado, se há tendência a coisa boa, mas a
maior probabilidade matemática é para coisa ruim, pode ser aventada
delicadamente essa hipótese do mau. A angústia de quem espera o resultado de
uma biópsia com tudo desfavorável, não deve ser confrontada com esperanças vãs
de exame normal. Isso é irresponsabilidade. Melhor esperar pra ver.
A morte é para sempre,
e o reencontro será para nunca. Já no amor a conotação do sempre e do nunca
recebe mil outros significados. Quem ama e é amado, quer que o amor bilateral
dure para sempre, pelo menos até que a morte os separe. Mas, enquanto a
liquidez de dinheiro é uma coisa boa, o sentimento em estado sólido parece ser
mais durável. Saber lidar com perdas amorosas é tarefa para gigantes. Mas o
apaixonado só se agiganta com essas perdas. Algumas vezes é preciso alguém dar
uma bofetada na cara do abandonado, com uma frase dura: ele não vai voltar
nunca mais. Assusta, mas é didático. Fazer nascerem esperanças inúteis é dar
duas surras na mesma pessoa. Não esperar nada e nada receber é menos traumático
do que ficar paralisado esperando algo que não chegará.
Para quem espera, qual
tempo será maior e mais terrível, o sempre ou o nunca? Na vida tudo é relativo,
personalizado, individualizado. E para coisa boa, um novo amor, por exemplo,
que nunca precisemos esperar pelo nunca mais.
* Médica endocrinologista, jornalista
profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a
Hiperatividade”
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