quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

CARTAS QUE NÃO SE REPETIRÃO JAMAIS Nº 9 – DE URDA ALICE KLUEGER PARA GILBERTO GIL E CAETANO VELOSO

(Em papel timbrado da Academia Catarinense de Letras – datilografada – fotocópia)

Blumenau, 27 de outubro de 1994.

Meus doces anjos:

Queria escrever uma carta para Gil e outra para Caetano, mas como separá-los? Quero dizer a ambos as mesmas coisas; no meu coração estão tão juntos que não há como escrever uma carta diferente para cada um, e daí a ideia de uma só carta para os dois: fotocopio-a, sorteio quem vai ficar com o xerox, resolvo o meu problema.      

Que quero lhes dizer, meus ternos baianos? Quero lhes dizer tudo, e esse tudo é tão grande que uma carta fica sendo uma coisa boba.

Eu os tenho amado pela vida afora, como sei que tantos brasileiros (e também não-brasileiros, vi o quanto são amados em Cuba e outros lugares) o têm feito. Vocês foram a luz que iluminou os altos e baixos da minha adolescência; são o arrimo das ideias da minha vida adulta; foram sempre a ternura derretendo o coração.

Doces anjos, creio que vocês têm ideia da influência que exerceram sobre toda a minha geração, e exercem sobre as novas gerações que estão chegando. A gente retribui essa influência amando-os, e esse amor deve chegar até vocês, pois há sempre mais energia e ternura emanando de vocês e criando mais amor, como aqueles círculos que se formam na água quando a gente atira uma pedra num lago parado.

Um dia, faz mais de dez anos, vi Caetano de pertinho, depois de show na minha cidade, e guardo aquele momento no meu coração com a calidez do momento em que nascem as estrelas azuis.

Antes de ontem vi Gil, toquei-o, mal queria acreditar que aquilo estava acontecendo mesmo. Talvez Gil se lembre, falamos de livro meu onde Caetano é personagem, deu-me até o endereço para que lhes enviasse o mesmo, disse-me que Caetano gostaria de conhecer o livro.

Envio o livro agora, depois de anos que saiu. É uma história de amor, a única que arrisquei até hoje (sou romancista-histórica) e havia que colocar um de vocês no livro. Acabou sendo Caetano, pela época em que se passa e por “Alegria, alegria”, música que até hoje orienta minhas decisões na vida, por seu fortíssimo verso que diz tudo: “Por que não?”.

Se vocês chegarem a ler o livro, não exijam muito dele. Sou aprendiz ainda, há muito o que me aperfeiçoar para algum dia escrever realmente bem. Se o lerem, deem-me a alegria de um retorno, duas linhas me dizendo que o fizeram, para que meu coração possa se expandir de alegria ao saber que meus ídolos, meus heróis, um dia compartilharam comigo aquelas linhas que escrevi anonimamente no meu quarto, que houve uma comunhão entre nós, por algumas horas – vai ser difícil não morrer de felicidade!

E, anjo Caetano, não me leve a mal por ter tomado a liberdade de usá-lo como personagem meu: a magia da vida, do mundo e de vocês deu-me tal direito que, espero, você não conteste.

Meus baianos gurus (eu sou totalmente louca pela Bahia; pretendo, daqui a ano e pouco, ir morar de vez no Pelourinho), inclino-me ante vocês para dizer: Axé! Poderia escrever um livro para falar da minha ternura e do meu amor por vocês, mas aí teriam que tirar muito tempo para lê-lo e seria até enfadonho para quem já sabe do amor que desperta em todo um povo.

Meus queridos, muita luz! Deus os abençoe! Eu os amo.

URDA ALICE KLUEGER

Rua 7 de Setembro 1314
89.010.202 – Blumenau – SC (endereço de muitos anos atrás, que já não funciona.)
urdaaliceklueger@gmail.com – e-mail atual

* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR, autora de mais três dezenas de livros, entre os quais os romances “Verde Vale” (dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12 edições).



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