Criatividade
do ostracismo
* Por Pedro J. Bondaczuk
"A literatura brasileira, a exemplo do próprio país,
passa por uma crise de criatividade", afirma-se, amiúde, com ares
doutorais, em determinados círculos. Comenta-se, não apenas acerca das letras,
mas também das artes plásticas, da música erudita e até da popular, que há hoje
um vazio de qualidade.
Mas estaria de fato ocorrendo esta generalizada ausência de
talento ou os críticos é que não estão conseguindo enxergar os bons trabalhos
que se produzem por aí? Prefiro acreditar na segunda hipótese, diante da
quantidade de originais de livros que me são encaminhados para apreciação e que
acabam inéditos.
Há um preconceito indisfarçável contra o escritor novo. Ou
contra aquele que se recusa a engessar seu talento com os modismos em voga
entre pseudo-intelectuais.
Fala-se, freqüentemente, em modernidade, sem que ninguém
defina com precisão o que venha a ser isto. A arte, todavia, quando autêntica,
quando boa, quando praticada por artistas e não empulhadores, não é antiga e
nem moderna. É atemporal. Adquire foros de eternidade.
As obras de William Shakespeare, por exemplo, mesmo se forem
levados em conta a linguagem e o estilo de sua época, são lidas, relidas,
pesquisadas e interpretadas todos os dias em várias partes do mundo. Caso fosse
encarada pelo enfoque dos modismos, seria considerada absolutamente
"demodé". Mas qual o intelectualóide que se atreveria a tanto?!
Dos originais que temos lido, em vários gêneros, como
poesia, conto, novela e ensaio, a maioria é constituída por textos muito bons.
Causa pasmo saber que os seus autores não conseguem editar esses trabalhos após
estafantes e frustradoras peregrinações
pelas editoras.
Que não se diga, portanto, que a literatura e as artes em
geral estejam em crise. Talvez esteja havendo, isto sim, excesso de arrogância
por parte daqueles que são incumbidos de decidir se essas obras devem ou não
vir a público. A argumentação para o veto da publicação de escritores jovens é
sempre a mesma: o fator econômico.
Dizem os editores que, em virtude da crise e dos custos de
produção, os lançamentos precisam ser muito criteriosos e que ninguém quer
correr o risco de encalhes em prateleiras de livrarias. O argumento pode até
ser válido. O que é inconsistente é a afirmação de "críticos" de que
o País se encontra em um vácuo de criatividade.
Há, isto sim, autênticas "igrejinhas", fazendo com
que as obras sejam selecionadas para publicação ou não por critérios que
absolutamente fogem à sua qualidade artística.
Neste aspecto, os que mais sofrem são os poetas. É claro que
no meio dos muito bons há os apenas razoáveis e uma infinidade de maus, senão
péssimos "versejadores". Por isso, pesa uma espécie de anátema sobre
a poesia contemporânea brasileira como um todo. Em geral, quem faz esse gênero
de literatura e quer ver os trabalhos publicados, ou arca com os custos
proibitivos de uma edição --- absolutamente inacessíveis para a maioria --- ou
se contenta em mostrar seus versos em rodinhas de botequins.
Raros, raríssimos, conseguem furar a barreira das editoras
para esbarrar mais adiante no preconceito dos críticos. Mesmo aqueles que, como
Fedor Dostoievsky, entendem que "a missão da poesia é a de queimar com o
verbo os corações".
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas
(atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e
do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe,
ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma
nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991
a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição
comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
A presidente da Academia Montesclarense de Letras, Maria Luiza Silveira Teles, me confessou há dois dias, que publicou um livro de poesias há dez anos, em 5 mil exemplares, e não vendeu nem mil. Ela tem mais de vinte livros publicados, um deles com mais de 100 mil exemplares comercializados, em várias edições. Versa sobre diversos temas na linha da educação, psicologia e religião. Os editores vivem atrás de conteúdos produzidos por ela, para publicar. Maria Luiza cede os direitos autorais e recebe uma pequena porcentagem da venda (15%). Arrependeu-se desse tipo de negócio, mas, como professora aposentada, não tem como arcar com as despesas. Imagine você, Pedro, uma autora conhecida. Diante disso, entende-se o motivo de o autor em seu primeiro livro ser ignorado.
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