As crianças palestinas estão nascendo em Santa
Catarina
* Por
Urda Alice Klueger
(Escrito
em 2008, mas de grande atualidade neste ano de 2014)
Por todos os lados
estão as notícias, principalmente nas agências especializadas da Internet, pois
a grande imprensa que chega à maioria das casas vem com a maquiagem necessária
para que não se dê muita atenção, para que pareça coisa de brincadeirinha,
quando a cruel verdade é bem outra: o genocídio palestino vai de vento em popa
– a Faixa de Gaza estertora na inanição e na violência – as crianças que seriam
o futuro daquele país que sequer existe, segundo os interesses do Capital e do
mais revoltante dos sentimentos racistas, estão tendo as vidas ceifadas de
muitas formas, para que um dia já não exista o povo palestino, para que um dia
aqueles dois pequenos pedaços de terra onde a Palestina ainda sobrevive já não
tenha quem os reclame. Acho bom explicar um pouquinho mais: não existindo mais
o território palestino, o Estado de Israel poderá dominar aquele espaço
encravado lá no meio do rico território árabe, ponta de lança que é do de
sempre: os Estados Unidos. O malfadado Grande Irmão do Norte[1] precisa dominar
aquele espaço lá, altamente estratégico para as suas cobiças financeiras: o
Estado de Israel está como que situado dentre um mar de petróleo e de outras
riquezas minerais, e os políticos corruptos dos dois países, mais os homens
corruptos que venderam a alma ao diabo em troca do deus Capital, também de
ambos os países, tratam de acelerar o genocídio palestino, para mais tarde já
não ter que se incomodar com a resistência desse povo que teima e teima em
viver.
Penso que devo deixar
claro, aqui, que não estou me referindo ao povo judeu como um todo, pois há
muita gente muito decente dentro daquele povo. Prova de tal coisa são diversas
mensagens que recebi, quando um dos meus textos acabou causando uma polêmica
homérica, por conta de má interpretação intencional de gentes envolvidas na
causa do genocídio – ao mesmo tempo em que eu era crucificada como a vilã do
povo judeu, diversos soldados do exército judeu, de nacionalidade e religião
judaicas, na época servindo seu país e tendo que participar do desmonte do que
ainda restava da Palestina, escreveram-me apoiando as denúncias que então fiz,
fora outras e outras manifestações recebidas.
Mas voltemos à inanição
e à violência a que estão sendo submetidos os palestinos ainda sobreviventes, e
talvez pensemos: já não há o que fazer; que podemos nós, sem as poderosas armas
e sem os bilhões de dólares dos poderosos que destroem um povo, provavelmente
ate à última pessoa? É possível que desanimemos diante de tão cruel realidade,
que pensemos que a “solução final”[2], acabou, mesmo, chegando (e não para o
povo judeu) - mas daí chegam notícias tão fascinantes, mas tão fascinantes, que
até nos volta a esperança! As crianças palestinas já não estão nascendo na
Palestina! Nem todas, é claro, mas muitas e muitas crianças palestinas estão
nascendo por aí, pelo mundo todo, e nesta semana eu soube que nasceu mais uma,
assim bem perto de mim, uma pequenina menina de cabelos escuros chamada Laura,
e ela já nem é a primeira criança daquela família: a esperá-la já havia o
irmãozinho Iudi, um descendente de beduínos e de profetas que também já havia
nascido aqui nas terras do sul do Brasil, crianças tão americanas e brasileiras
quanto palestinas, pois se aqui nasceram foi por contingência do destino, foi
porque seus antepassados até a cidadania palestina acabaram perdendo – mais um
pouco e perdiam a vida.
Ante meu entusiasmo com
o nascimento de Laura (Iudi eu já conheci crescidinho), alguém me disse:
- Mas não se trata de
uma criança palestina – ela é tão brasileira quanto tu! – e eu pensei no meu
avô, que já nascera brasileiro também, e nas tantas etnias que se mesclam por
este meu imenso país, mas pensei, também, na Injustiça que se perpetra contra
todo um povo, e nas crianças do povo judeu que nasceram em tantos lugares
também, e que um dia voltaram àquela terra a que se sente ligado aquele povo, e
pensei que a pequenina Laura e seu irmãozinho Iudi vão acabar crescendo conscientes
do que aconteceu com a sua família e a sua pátria, e terão, possivelmente, um
sentido de identidade tão próprio, tão deles, tão forte...
O fato é que a roda da
História gira, e pequenas Lauras, e pequenos Iudis, estão nascendo por todo o
mundo, enquanto seus parentes morrem de inanição ou por massacre numa Palestina
destinada ao sumiço.
Bem-vinda a este mundo,
Laura! Que as fadas te sejam boas e que o teu fardo não seja tão pesado. Trazes
em ti a herança dos beduínos e dos profetas – vais saber achar o caminho que
será melhor para ti. O que mais me emociona ao saber que chegaste, é que nem o
Grande Irmão do Norte e nem os políticos corruptos de Israel estão fazendo a
conta das tantas Lauras, tuas priminhas, estão nascendo ao redor do planeta!
[1] Experimente ler um
livro chamada “1984”, de George Orwell
[2] Solução final:
expressão usada pelo nazismo hitleriano, que significava a extirpação por morte
de todos os judeus da Europa.
Blumenau, 27 de janeiro
de 2008
* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e
doutoranda em Geografia pela UFPR
..
O nascimento de uma criança é um alento de esperança.
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