* Por Evelyne Furtado
A primeira vez que ouvi Caetano foi na casa de Tio
Geraldo, na Rua Potengi. Tinha menos de dez anos pelos meus cálculos feitos com menos rigor que emoção.
Escutei Mora Na Filosofia, em alto volume como meu tio gostava. Não sabia o que era filosofia, nem entendia a letra, mas Caetano me ganhou ali.
Depois, outro tio, em outro endereço, dessa vez de frente para o mar de Areia Preta, chegou com o LP Araçá Azul, trazendo o polêmico Caetano Veloso de tanga na capa. Experimentalismo que eu não dava conta, mas já gostava.
Mas tarde ganhei de meu pai um álbum duplo com as músicas, que nas minhas contas adolescentes, eram de um passado remoto (contas de adolescentes são tão equívocas!). Então me apaixonei por Alegria, Alegria, Coração Vagabundo, Baby e decorei o discurso de Caetano no Festival. É proibido proibir!
A partir daí eu já era fã de Caetano e o acompanhava. Em um show em Natal ele cantava Força Estranha e Como Dois e Dois quando alguém da plateia gritou: _ Cante uma sua! Foi o suficiente para assistirmos um sermão esclarecedor de Caetano Veloso destinado àquele fã, que provavelmente não gostava de Roberto Carlos. Caetano mostrava claramente que não tinha preconceito.
Nesse mesmo espetáculo houve certa confusão perto do palco e alguns policiais intervieram. Confesso aqui minha total ignorância sobre o estado ditatorial no qual vivíamos ao fim da década de setenta. Mesmo assim achei o máximo quando ele pulou o alambrado do ginásio e veio conversar com os guardas a duas arquibancadas de onde eu estava. Aquele homem leve como uma pluma, vestido com um short minúsculo branco dava mostras de coragem e bom senso ali na minha frente. Resolvida a confusão o show continuou.
Venho ouvindo, lendo e vendo Caetano Veloso só e bem acompanhado: Doces Bárbaros, com Gil, Gal e a irmã Betânia, com Chico (que parceria, meu Deus!), com Roberto Carlos, em filme de Almodóvar, com Djavan e, mais recentemente com Maria Gadu. Ele brilha e respeita o brilho do outro.
Caetano completa setenta anos melhor do que nunca. A oração ao tempo deu certo. Não foi ele quem disse que artista não envelhece?
Em mim só crescem a admiração e o afeto. Admiro suas letras: poemas ousados, belos e geniais. A minha língua é lírica e bela, culta ou inculta em Caetano Veloso. Maravilha!
Adoro suas interpretações, que vestem bem músicas consideradas menores e concedem originalidade a consagradas canções de outros compositores. Caetano dá vestes celestiais às próprias criações e canta como um anjo da ordem Joãogibertiana.
Falo em afeto, pois aqui estão registradas minhas memórias afetivas ligadas ao poeta e músico de Santo Amaro da purificação e na minha casa encanta desde a minha mãe até a minha filha.
Talvez minha mãe seja a mais apaixonada. Mas duvido. Sou louca por ele!
E como falar em amor sem lembrar meu pai? Sampa era sua música preferida e toda santa vez que ouço me emociono. Ah! Bruta flor do querer.
• Poetisa e cronista de Natal/RN
Quando Caetano Veloso fez a música tema do filme Tieta, "A Luz de Tieta", e teve a petulância de rimar "Êta" com "Tieta" no refrão abaixo, quase foi apedrejado.
ResponderExcluir"Êta!
Êta, êta, êta
É a lua, é o sol
é a luz de Tieta
Êta, êta!.."
Pode ser que esses versos destoem do restante da obra, não importa. Eu gosto, ainda que não seja uma obra prima. E para quem é gênio, aquele tipo que se supera dezenas de vezes, pode de vez em quando fazer uns versinhos bobos, mas que ainda assim arrancam aplausos. Como você, Evelyne, adoro e aplaudo, desde os meus 13 anos quando conheci "Alegria, Alegria" em 1968. A mais bonita de todas.