Anjos
acham difícil manter a guarda
* Por
Marcelo Sguassábia
Veja como são as
coisas. Há cinquenta anos - e isso é um piscar de olhos nas cronologias
serafínica e querubínica - , cada anjo dava conta de guardar dois, três, até
mais viventes de carne e osso. A vida era calma e o perigo era pouco. Agora, se
bobear é preciso um regimento dos nossos para pajear cada humano. E o déficit
funcional se vê em todas as esferas celestes, entre os anjos da guarda
municipal, estadual e federal.
Quanto mais a
humanidade inventa traquitanas e afazeres, mais perigo se corre e mais
desavisados temos que ficar puxando da beira do precipício. Os malditos
smartphones são os piores exemplos do que estou dizendo. Eles distraem a
atenção de todos o tempo todo, nos deixando em sobressalto, sem saber a quem
acudir primeiro e sem poder pregar olho para recuperar as forças. Crianças não
fazem seus deveres, casais brigam sem motivo, velhinhos deixam de jogar damas
para fazerem a alegria dos hackers nos sites de banco e lojas virtuais. É só
cilada, uma atrás da outra.
A mesma tecnologia que
dá inteligência a celulares está produzindo gerações de acéfalos. E joga
milhões de profissionais para as estatísticas dos economicamente inativos. O
desemprego deixa as pessoas desorientadas pelas ruas, o que nos obriga a ficar
virando seus pescoços para os dois lados a cada cruzamento que atravessam, para
não aumentar ainda mais os já estúpidos índices de acidentes.
A eleição do
zen-budista Donald Trump, somada à incontestável sanidade mental daquele
ditador norte-coreano, fez soar a trombeta de alerta máximo aqui nas nuvens. As
chances de um tilt global e irreversível são todas e mais algumas, e não há
previsão para publicação de edital para contratação de novos anjos da guarda. O
último aconteceu lá pelos idos da revolução francesa e, embora sejamos eternos
no cargo, a população aí embaixo é
extraordinariamente maior que o nosso efetivo. Só para se ter uma ideia:
em 1800, o mundo contava com 978 milhões pessoas, enquanto que hoje só na China
são um bilhão e quatrocentos milhões. E o nosso exército angelical permanece
com o quadro inalterado...
Outro agravante é a
expectativa de vida. Apesar de estarem correndo cada vez mais perigo,
estranhamente vocês estão conseguindo viver muito mais. É um paradoxo, mas é
verdade. A evolução da medicina e das tecnologias envolvidas nos sistemas de
segurança viária talvez expliquem um pouco essa intrigante realidade. O fato é
que, mais uma vez, sobra para nós. Além de cada um dos nossos se ocupar de mais
gente, essa mesma gente não veste o paletó de madeira de jeito nenhum, e está
vivendo o dobro de seus bisavós. Junte a isso as maternidades abarrotadas de
recém-nascidos e chegamos a uma situação caótica, beirando o descontrole
absoluto. De anjos da guarda estamos nos transformando naqueles caras que ficam
girando pratinho no circo. Tire esse riso da cara, por favor. O assunto é
sério, e você ri porque não é com você.
* Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Bota zen-budismo e sanidade nisso daí.Serviço multiplicado por mil, e queda da eficiência. Pobres anjos.
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