Pro canto e de costas!
* Por Fernando Yanmar Narciso
Sou um dos últimos representantes da “silver age” da pedagogia. Nem em
meus sonhos fui um bom aluno, afinal estudar é, foi e sempre será um chute ali
embaixo. Mas, graças à persistência e a visão de (alguns dos) meus professores,
diretores, psicólogos e, principalmente, meus pais, consegui me sair
razoavelmente bem atrás da carteira (sou tão bondoso comigo mesmo...). Então,
eu e os vários colegas que tive vivenciamos o progressivo sucateamento do
sistema educacional. Eu sei, temos uma parcela da culpa do que acontece
atualmente, mas não chegamos nem aos pés da geração de hoje.
Gabriel o Pensador já havia nos alertado, o Pink Floyd também.
Praticamente toda a população do Facebook também está careca de saber, agora só
falta que as pessoas a quem o assunto “realmente interessa” abram os olhos: A
educação, não apenas do Brasil como praticamente do mundo todo, precisa de uma
revolução urgente. O mundo mudou, as pessoas mudaram, então por que só o “bom e
velho” ler até decorar continua valendo como o método de ensino mais eficaz?
Meus pais costumam me contar que, no tempo em que eles iam à escola, a
profissão de educador dava muito status a quem se habilitasse. Respeitados, os
professores precisavam se apresentar ao trabalho de terno. Tinham, para a
época, bons salários e às vezes podiam ter bons carros. E a punição para a
indisciplina na sala de aula era sempre severa. Podemos até não aprovar aqueles
métodos fascistas de manter a ordem na sala, como palmatória, chapéu de burro,
castigo no canto e afins. Mas podem apostar que a linha que separava
professores e alunos era bem clara. Ele estava lá para ensinar e nós estávamos
lá para aprender, nada a mais ou a menos. E ai de quem se atrevesse a
desrespeitar a ordem natural!
Então, chegamos à atual situação... Noutros tempos, quando o aluno
levava um boletim sofrível para a casa, a culpa era exclusivamente dele. Hoje,
os pais simplesmente creem que o professor tem a OBRIGAÇÃO de abrir a cabeça do
catarrento e IMPLANTAR a lição no cérebro deles, por isso ainda se deixam ser
extorquidos pela mensalidade. Logo, se a nota do delinqüente é baixa, a culpa é
do sofredor acuado entre a mesinha e a lousa. Os irresponsáveis pais de hoje-
que, estimo eu, de cada dez casais, apenas um fez filhos de propósito- pensam
nos professores como Moisés conduzindo os escravos através do deserto,
exercendo função de pais, professores, psicólogos, assistentes sociais e até
motoristas da van do colégio. Muita areia pro carrinho de mão de qualquer um!
Num mundo onde parecemos atirados num barril cheio de macacos, o
bullying dita as regras nos corredores dos colégios. A hostilidade é tanta que,
se algum aluno se atrever a saber um pouquinho a mais que os outros, logo vira
um alvo móvel para os brucutus da classe. Numa inversão curiosa, os estúpidos logo
darão continuidade à raça humana e os inteligentes precisarão viver escondidos.
Nessas condições, o que o professor pode fazer? Na terra livre e sem regras de
hoje, eles apanham dos alunos até mais que os alunos queridinhos. Tirando a
Professora Helena, que toca a classe como um violino, todos os educadores de
hoje vivem com medo de ir trabalhar, desenvolveram síndrome de pânico e sequer
sentem vontade de se preparar melhor intelectualmente para exercer a profissão.
Para entrar no cubículo e ter de conviver com os presidiários de amanhã, só ser
concursado já basta.
Quando se é criança, o mundo é um parque de diversões. Na mente fértil e
distorcida de nossos filhos, eles mal podem esperar para crescer e ser aquilo
que sempre sonharam, para mostrar aos adultos babacas como é que se manda no
planeta. Eles vêem os pais trabalhando e imaginam o orgulho que terão ao seguir
os passos deles, sejam médicos, engenheiros, advogados, para citar as
profissões mais clássicas, ou até pedagogos. A diferença é que, na infância,
quando se pensa na carreira que pretende seguir, o dinheiro é a última coisa
que passa pela nossa cabeça.
Aí você cresce, e todo o romantismo que nossas visões ingênuas produziam
das profissões simplesmente evapora. Tornamo-nos os nossos pais. O pragmatismo
toma o lugar da emoção, e a única coisa que passa a importar é trabalhar para
ganhar o dinheiro suado e devolver tudo pro governo. E, quando menos esperar,
lá está você, ao lado de outros professores, entrando em greve para reivindicar
maiores salários. Mas se esqueceu de um pequeno detalhe: Se seus alunos vêem
que você está nessa profissão só por causa do dinheiro e que a formação
intelectual deles sequer está em sua lista de prioridades, é óbvio que eles
nunca o respeitarão.
Já vi algumas vezes a seguinte pergunta na internet “Será que você,
quando era criança, gostaria do que se tornou na versão adulta?”, e é um
questionamento muito pertinente. Como você se sentiria ao acordar um dia e se
dar conta que pisoteou os seus próprios sonhos? Não sei de vocês, mas minha
versão pivete, se tivesse músculos, ia arrebentar minha cara. Se bem que meu
sonho era ser piloto de robôs... A principal diferença entre as crianças de
hoje e as do tempo de nossos pais é que as de hoje vivem num mundo onde já não
há mais nada a ser construído ou descoberto. Tá tudo pronto pra elas, basta
virem pegar. Quem ia querer batalhar por alguma coisa durante anos, na
velocidade em que o mundo moderno corre? Tudo para nós nesse instante, e que vá
para o inferno quem nos negar essa vontade!
*Designer e escritor. Sites: HTTP://terradeexcluidos.blogspot.com.br - HTTP://cyberyanmar.deviantart.com e HTTP://www.facebook.com/fernandoyanmar
Fernando,
ResponderExcluirAinda há muito a ser criado e desenvolvido. Até a mudança vertiginosa do mundo virtual. Quem correr ainda fará muito. Agora que as máquinas estão quase no comando, basta humanizar os humanos. Estamos precisando.
PS: Terno para dar aulas era no tempo da minha mãe.