Importância
das anotações
* Por Pedro J. Bondaczuk
Perguntaram-me, dia desses, sobre a importância das
anotações para um escritor no processo de redação de um livro. Depende! Alguns
escrevem de improviso, sem programação prévia e sem precisar de lembrete algum,
sobre o que quer que seja, assim, de repetente, ao sabor do que chamam de
“inspiração”, e o fazem bem.
Vários escritores com os quais conversei a respeito
afirmaram que preferem escrever dessa maneira. Ou seja, ao sabor do momento e
do acaso. Há, por outro lado, os que trazem tudo anotadinho, são primores de
organização, mas na hora de redigir... A priori, não há, pois, nenhuma regra
específica a esse respeito. Cada qual produz da forma que mais lhe aprouver e
que se sinta bem.
Claro que as anotações, dependendo de como e o que se anota,
auxiliam, e muito. Principalmente quando se está com a mente cansada, após
horas e mais horas de texto. Confiar na memória, por mais privilegiada que esta
seja, nessas circunstâncias, é um perigo. Volta e meia ela nos trai.
Eu, por exemplo, já fui traído “n” vezes por deixar de
consultar anotações e confiar cegamente na memória. Uma dessas “mancadas”, que
me deixou constrangido quando alertado por leitores, ocorreu quando redigi uma
crônica para determinado blog, a convite de seu proprietário. Vamos ao caso.
Conheci Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta, pessoalmente,
e fui grande admirador desse jornalista e talentoso escritor, que primava,
sobretudo, pelo bom-humor. Tenho vários dos seus livros (dois dos quais
autografados), com os personagens que Lalau criou, como o Mirinho (o Primo
Altamirando); como o Bonifácio Ponte Preta, o Patriota (aquele que costumava
caminhar pelas ruas do bairro comendo goiaba e assoviando o Hino Nacional);
como Tia Zulmira e vai por aí afora.
Todavia, ao redigir a citada crônica (versando, justamente,
sobre as diferenças entre crônica e artigo), ao mencionar o saudoso Stanislaw
Ponte Preta, chamei-o de “Rubens”, em vez de Sérgio, seu nome de fato. É o que
dá confiar na memória! Se erramos até naquilo que temos absoluta convicção (e
estes lapsos são para lá de comuns), imaginem quando se trata de algo sobre o
que não estamos lá tão seguros!
Conheço vários escritores que andam, para cima e para baixo,
ou com caderninhos de notas – como eram os casos do poeta pantaneiro Manoel de
Barros e do imortal autor de “Grande Sertão, Veredas”, Guimarães Rosa,
revelados, em excelente crônica, escrita pelo correspondente da revista Caros
Amigos em Mato Grosso do Sul, Bosco Martins, ou com blocos de anotação (o que
vem a dar na mesma). Como se vê, há excelentes exemplos a favor de se ajudar a
memória com um pouquinho que seja de organização e método.
Claro que alguns exageram. Sou amigo de um escritor (cujo
nome me reservo o direito de omitir) que é obcecado por anotações. Mantém
bloquinhos (que ganha de brinde de uma gráfica da qual é cliente de longa data,
feitos com aparas de papel) espalhados por toda a casa.
Tem um na cozinha, outro na sala, outro em seu criado-mudo,
junto à cama, outro no banheiro e assim por diante, além do que carrega sempre
consigo, onde quer que vá, no bolso da camisa. Todas as vezes que lhe vem
alguma idéia original à cabeça (e pelos seus tantos e tão bem aceitos livros,
estas lhe vêm em profusão), anota-a meticulosamente, onde quer que esteja.
Mas vai mais longe ainda em sua obsessão. Sempre que um
bloquinho desses fica cheio, numera-o e arquiva-o em uma gaveta do seu gabinete
de trabalho. Outro dia ele mostrou-me sua coleção. Sem nenhum exagero, havia
por volta de um mil deles, atados com elásticos, cada qual com as datas em que
começaram e terminaram de ser redigidos.
Só é difícil de entender como ele os consulta nas horas de
necessidade. Deve ter, lá, o seu método. Mas isso, reitero, é obsessão. O amigo
mostrou-me os bloquinhos em branco que tem em “estoque”. São três enormes
pacotes, cada qual com cinqüenta ou mais unidades! Anotar, tudo bem, mas tanto
assim?!!
Voltarei ao assunto, que me parece fascinante, por causa das
manias de determinados escritores que, reunidas, dariam, certamente, um
delicioso livro de comportamento (embora resultassem, provavelmente, na perda
de preciosas amizades). Quanto à pergunta que me foi feita, se sou a favor ou
contra esse tipo de anotações, prefiro continuar em cima do muro: depende!
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas
(atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e
do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe,
ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma
nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991
a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição
comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
Anotar tópicos sim, mas detalhes, creio que não. Escrever a estrutura do texto deve ser ao sabor dos pensamentos, mas retocá-lo, aí já é preciso usar muita astúcia nos reparos, trocas, escolhas de palavras, acréscimos, cortes e avaliação final. Quantas leituras? Pelo menos 30, mas quem lê pensa que foi "de prima".
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