Quem ri por último...
Hoje, por puro acaso, topei com um
artigo que publiquei, no dia 23 de maio de 1994, na coluna “Fera”, do Caderno
de Esportes do “Correio Popular” de Campinas, onde era editor (e não apenas de
uma única editoria). Esse espaço havia sido criado trinta dias antes da Copa do
Mundo dos Estados Unidos, como uma espécie de preparação, de “aquecimento” para
a cobertura daquele Mundial, que o jornal prometia que seria completa e
original (e foi), a despeito do pessimismo que cercava a Seleção Brasileira,
que havia se classificado para a competição na chamada “bacia das almas”. Por
pouco não ficou de fora. Ademais, fazia 24 anos da conquista do tri, no México.
Foi um ato de ousadia do Correio Popular.
Confesso que não me lembrava que havia
digitado esse artigo e arquivado em meu bagunçado e volumoso arquivo
eletrônico. E por que trago à baila, neste espaço nobre voltado à Literatura,
esse tema que, aparentemente, nada tem de literário? Por dois motivos
principais. O primeiro é para lembrar os leitores (e, sobretudo, as editoras)
que sou autor de um livro (ainda inédito) sobre sucessos e fracassos da Seleção
Brasileira, intitulado “Copas ganhas e perdidas”, atualizado com o “fiasco” do
nosso futebol (o segundo em casa) na desastrosa campanha de 2014, que culminou
com os “inesquecíveis” 7 a 1 sofridos
diante da Alemanha (sobretudo) e com os subsequentes 3 a 0 diante da Holanda.
Quem sabe alguém se interesse em bancar essa obra, antes ou durante o Mundial
de 2018 na Rússia?! O importante é que ela existe e está madura, prontinha para
ser publicada;
E qual é o segundo motivo para tocar
nesse assunto? É o de enfatizar o quanto uma intuição é valiosa (quando se confirma,
lógico, pois muitas vezes, desde que exposta publicamente, ela nos induz
somente ao absoluto ridículo se não der certo) . O título do tal artigo, que
localizei, hoje, por puro acaso, é “Já comprei minha camisa”. Com semanas de
antecedência do início do Mundial, previ a conquista do tetra, assim na bucha,
sem manifestar a mais remota dúvida e sem vacilar. O jornal criou, como havia
prometido, um “Caderno da Copa”, com o máximo de informações sobre a competição
e fui convidado para comentar a performance da Seleção Brasileira. Aceitei,
claro.
Destaco que depois da publicação do tal
artigo, os leitores não me deram sossego. Tanto eles, quanto os colegas de
redação. Tentaram ridicularizar-me de todas as formas, desde as sutis às mais
escrachadas (e inúmeras mal-educadas) e tive que ter muita paciência para
administrar as “piadinhas infames” que me eram endereçadas, por cartas (os
e-mails, então, nem existiam) e, principalmente, por telefone. Foi um
inferno!!! Pude comprovar o quanto o complexo de viralata está entranhado na psique
do brasileiro. Mas... quem, afinal, riu por último? Claro que foi este
jornalista que nunca temeu correr riscos!!!
Para que o leitor avalie meu “atrevimento”,
que resultou, finda a Copa, em aumento do meu prestígio junto à direção do jornal
– em vez do descrédito que as “cassandras de mau agouro” previam, para mim e
para os comandados de Carlos Alberto Parreira – reproduzo, na íntegra, o citado artigo que
comprova, inclusive, o surrado clichê que diz que “quem ri por último ri melhor”.
No caso, eu (e os raros brasileiros que acreditaram na Seleção) rimos com a
maior satisfação. Adoro uma polêmica!!! Leiam o que escrevi naquele distante 23
de maio de 1994, véspera do embarque da nossa equipe para os Estados Unidos:
“A
seleção brasileira, convocada a semana passada, e que embarca rumo aos Estados
Unidos amanhã, vai estrear na Copa do Mundo com 80% da capacidade física dos
jogadores, conforme previsão do fisicultor Moracy Sant'Anna. Isso é bom? É mau?
O tempo para a preparação, praticamente de menos de um mês, é curto, como se
propala? Acredito que não!
Até
porque a sua base é a mesma do grupo de 1990, que fez aquele fiasco, que todos
nós lembramos, na Itália. Ocorre que hoje esses jogadores estão mais
amadurecidos, mais experientes, mais tarimbados e mais conscientes da
importância da conquista do tetracampeonato, não apenas para a satisfação dos
150 milhões de brasileiros, mas principalmente para o fecho de suas carreiras.
Posso
dizer que vi, em uma oportunidade ou outra, a apresentação das 24 seleções que
vão disputar a Copa e não despontou entre elas nenhum "bicho-papão".
Pelo contrário, a grande maioria adota a mesma tática, o mesmo futebol-força,
com congestionamento do meio de campo, no máximo dois atacantes natos e apoio
dos laterais e miolo de zaga, como fator surpresa. Ou seja, a mesma forma com
que o Brasil joga.
A
diferença está no talento de um Romário, de um Bebeto, de um Zinho e de um
Leonardo, coisa que os nossos adversários não têm.
Ninguém,
evidentemente, pode prever quem irá conquistar a Copa. Se isso fosse possível
nem haveria disputa. A graça desse esporte e o motivo de ele empolgar multidões
é exatamente a sua imprevisibilidade. Nem sempre o melhor é o campeão. Prova
disso foi o último Mundial, o da Itália, em que a Alemanha teve uma
apresentação discretíssima e emplacou seu tricampeonato sem nenhum brilho.
Aliás, na fase de classificação, chegou a ser decepcionante, colhendo magros
resultados que lhe permitiram apenas se arrastar até a final.
Apesar
de tudo isso, por uma questão, digamos, de sexto sentido, de intuição, fiz uma
coisa inédita enquanto torcedor doente da Seleção. E olhem que esta será a 12ª
Copa do Mundo da minha vida. Comprei uma camisa canarinho, de número dez --- de
Pelé, para dar mais sorte --- na certeza de que desta vez irei, finalmente,
soltar o grito que ficou preso na garganta em 1982, por causa do "verdugo
de Sarriá", o italiano Paolo Rossi. Aquele time, apesar de haver ficado marcado
pelos fatídicos 3 a 2 para a Itália, foi empolgante, espetacular, mágico.
Vejo,
todavia, uma determinação maior no atual grupo, que em momento algum, mesmo nos
heróicos 6 a 0 contra a Bolívia, no Recife, durante as Eliminatórias, contou
com a confiança do torcedor. Além disso, nossos adversários, convenhamos, não
são bichos-papões.
A
Rússia está às voltas com briguinhas de comadres, e muitos dos seus principais
astros não foram convocados. Camarões, apesar da autoconfiança (excessiva) de
seus jogadores, é uma seleção envelhecida em quatro anos (a base é a mesma de
1990) e sequer foi a campeã da Copa da África. A Suécia é aquilo que
conhecemos. Provavelmente foi o selecionado que o Brasil enfrentou mais vezes
em mundiais.
Daí
não ser preocupante o fato de a nossa equipe estrear com apenas 80% da sua
capacidade física. O auge será, e deve ser, atingido na grande final, quando
poderemos soltar o grito preso na garganta há sofridos 24 anos: é tetracampeão,
é tetracampeão!!”
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Coragem monstra. Nem a mãe do técnico ousaria tanto. Estamos precisando. Na lavada que levamos, fui covarde. Só vi até o terceiro gol. Desliguei e fiquei a ouvir os gritos, sem acreditar.
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