Condicionados para a
competição
“A raiz do mal reside
no fato de se insistir demasiadamente que no êxito da competição está a
principal fonte de felicidade”. O autor dessas observações é um dos homens mais
sábios, mais participativos e, também, mais polêmicos do século XX: o
matemático, filósofo e pacifista inglês, Sir Bertrand Russell. Somos
condicionados, desde a mais tenra infância, a sermos competitivos, como se a
vida fosse um jogo. Não é! Não raro, testamos nossos limites e nos empenhamos a
ir além deles, apenas para superar supostos competidores. Colocamos, à nossa
frente, objetivos que, quase sempre, são inalcançáveis, e nos frustramos quando
não os atingimos. Queremos ser mais, ter mais, fazer mais do que os outros,
quando a vida não é isso, ou não deveria ser. Não a nossa, seres racionais e
dotados de livre arbítrio.
Precisamos é conhecer e
desenvolver nossas capacidades e viver, sem nos preocuparmos se o vizinho
conquistou ou não mais coisas do que nós. Se nos superou e obteve posições mais
elevadas, maior prestígio social ou mesmo familiar do que obtivemos. Mário
Quintana observa: “A vida não é um jogo onde só quem testa seus limites é que
leva o prêmio. Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade. Se a
meta está alta demais, reduza-a. Se você não está de acordo com as regras,
demita-se”. Agindo assim, pode ser que não sejamos os “campeões” que pretendemos
ser. Mas alcançaremos prêmio maior e muito mais cobiçado, sem preço: seremos
felizes! Afinal, não fazemos da competição uma arma para chegarmos à cobiçada
felicidade, como observou sir Bertrand Russell, e não nos frustramos? Mesmo que
não admitamos ou que nem mesmo tenhamos consciência, fazemos sim, e muito, e o
tempo todo.
É verdade que somos
educados, desde tenra idade, para a competição, reitero. Todavia, nem sempre
(ou quase nunca) estamos dispostos a seguir regras. Embora retoricamente
condenemos essa atitude, na prática agimos achando que os meios (lícitos ou
não, éticos ou não, justos ou não) justificam os fins. Corremos o tempo todo,
no curso de toda a vida, atrás de sombras, de coisas abstratas, de ilusões. A
substância, no entanto, raramente se faz presente em nossas cogitações. O homem abre mão do usufruto da beleza que
existe em tudo o que nos cerca, bastando apenas um pouco de atenção para ser
percebida e aproveitada – e onde reside a verdadeira felicidade – foge das
emoções sadias, para tentar conquistar o abstrato: fama, fortuna e poder.
Trilogia maldita que desgraça multidões! Sombras, fumaça, ilusões...
Nem toda a culpa nos
cabe, se é que caiba alguma. Afinal, insisto mais uma vez, somos condicionados,
mal começamos a entender as coisas, para renhida competição: pelo afeto dos pais
e parentes, pela admiração dos mestres, pela conquista de uma parceira, por
posições profissionais e sociais e vai por aí afora, Somos educados, sutil ou
ostensivamente, para, de uma forma ou de outra, superarmos alguém em alguma
coisa. Isso abstraindo os esportes que, obviamente, exigem competitividade por
sua própria natureza. É errado sermos competitivos? Depende de como e com quem!
Caso respeitemos regras, não sejamos impiedosos com os que viermos a superar e,
ao contrário, soubermos ser generosos e solidários com os mais fracos, será um
comportamento justo e até desejável e natural. Nosso próprio nascimento se dá
em conseqüência de competição. Somos frutos de um único determinado
espermatozóide, que venceu a corrida com bilhões de outros e que se uniu a um
também único óvulo específico dos cerca de 300 que eram possíveis de se ligar.
O historiador inglês do
século XVIII – expoente do iluminismo – Edward Gibbon, aponta, de maneira
pitoresca e peculiar, quem deva ser nosso competidor, com o que, aliás,
concordo sem titubear. Sugere que devamos competir, sim, e, sobretudo vencer,
mas tendo por concorrente não fulano, beltrano ou sicrano, mas nós próprios. Ou
seja, que empenhemos o máximo de esforços
para nos superarmos a cada dia, para sermos mais inteligentes, mais criativos,
mais úteis, mais honestos e mais solidários hoje do que fomos ontem e assim
sucessivamente, dia após dia, até nosso derradeiro suspiro. Raros, raríssimos
pensam assim e mais raros ainda são os que agem dessa forma. Gibbon acentuou a
propósito: “Nós nos melhoramos com vitorias sobre nós mesmos. Competição deve
existir e você deve vencer”.
Competir significa
luta. Por isso (infelizmente) não é incorreto dizer que “viver é lutar”.Trocando
em miúdos, não deixa de ser cristalina realidade. Encerro estas reflexões de
hoje (que tenho plena consciência de serem polêmicas, tendentes a gerar
divisões), com o seguinte comentário, não menos polêmico, do professor do
colégio colombiano Mundo Montessori, Pablo Lipnizky, no filme “Educação
proibida”: “Todo mundo fala sobre a paz, mas ninguém educa para a paz. Pessoas
são treinadas para a competição, e a competição é o começo de uma guerra”. Ou
estaria errado? Claro que não!!!
Boa leitura.
O Editor
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